Quebra de
ética em pesquisa norte-americana gera debates e pode levar o
povo Yanomami a processar o Estado norte-americano
A
antropóloga e presidente da Comissão Pró-Yanomami
(CCPY), Alcida Rita Ramos, participou como principal palestrante do
fórum "Ciência, Ética e Poder", promovido
pelo programa de Doutorado em Antropologia e História da Universidade
de Michigan (EUA), no dia 9 de março de 2001. O fórum
discutiu a repercussão das matérias publicadas pela imprensa
internacional, norte-americana e brasileira sobre a pesquisa realizada
pelo geneticista e pesquisador daquela universidade, James Neel, junto
ao povo Yanomami, nas décadas de 60 e 70. Essa pesquisa foi financiada
pela Agência de Energia Nuclear dos Estados Unidos (AEC).
As
matérias denunciaram o comportamento anti-ético do geneticista,
falecido no ano passado. Com seus colaboradores, entre os quais o antropólogo
Napoleon Chagnon, Neel coletou milhares de amostras de sangue Yanomami
no Brasil e na Venezuela, trocando-os por mercadorias, sem o consentimento
devidamente informado dos próprios Yanomami. Essas amostras de
sangue estão hoje nos laboratórios das universidades da
Pensilvânia e Michigan, sendo utilizadas para novas pesquisas
pelo Human Diversity Genome Project (HGDP), abrindo assim possibilidades
para patenteamentos futuros de material genetico Yanomami.
As
pesquisas do geneticista James Neel poderão ser objeto de processo
judicial, a ser movido pelo povo Yanomami contra o Estado norte-americano
(a AEC foi absorvida pelo Departamento de Energia americano). Os Yanomami
poderiam assim solicitar reparação de danos causados pela
coleta de amostras de sangue sem consentimento informado e impedir o
uso de seu DNA sem acordo prévio pelo HGDP.
Estas
informações foram prestadas pelo antropólogo Bruce
Albert, membro do Conselho Diretor da Comissão Pró-Yanomami,
durante mesa redonda via Internet organizada e promovida pelo antropólogo
Robert Borofsky, da Universidade do Havaí. Os debates, que estão
em curso, contam com a participação de seis antropólogos
de diferentes países. Seus textos serão divulgados ao
público, a partir da terceira rodada da mesa redonda, em um site
a ser aberto na internet no próximo mês de junho. (CCPY,
29/03/01)
Declarações
do Ministro Geraldo Quintão e do Governador Neudo Campos sobre
a Terra Yanomami são refutadas.
O
ex-Senador, ex-Ministro da Justiça, atual presidente da Fundação
Milton Campos e articulista do jornal O Estado de S. Paulo, Jarbas Passarinho,
manifestou-se publicamente sobre as declarações do Ministro
da Defesa, General Geraldo Quintão, por ocasião da recente
visita desse General a Roraima, de que a demarcação da
Terra Yanomami teria sido “um erro”. Passarinho, em artigo
publicado no mesmo O Estado de S.Paulo no dia 27 de março, defendeu
enfaticamente a manutenção da Terra Indígena Yanomami.
Com
riqueza de detalhes, o ex-Ministro da Justiça relembrou o longo
processo que envolveu os três poderes da República e que
resultou na demarcação e homologação da
Terra Yanomami. A participação decisiva do ex-Ministro
da Justiça fica evidente em sua matéria: “Acionei
a Consultoria Jurídica e a Secretaria Nacional de Direitos da
Cidadania, ambas do ministério.
A
Funai constituiu um grupo técnico encarregado de dar parecer.
Fê-lo em 22 de julho de 1991 opinando pela demarcação
da área de 9 milhões de hectares em linha contínua”.
Prossegue o ex-Ministro: “Os ministros militares decidiram atribuir
ao ministro-chefe do Gabinete Militar o parecer solicitado (...). O
Itamarati, cujo chanceler era um magistrado, foi favorável (...).
O
gabinete Militar, em nome também do EMFA e dos Ministérios
da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, opinou pela
remessa do processo ao Conselho de Defesa. Entrementes, o meu consultor
jurídico e o secretário-executivo consideraram inexistente
qualquer ameaça à soberania e à segurança
nacionais, respaldados em eminentes juristas.” Passarinho evoca
a Constituição Federal como princípio norteador
de suas decisões: “Ministro da Justiça, deveria
eu ser cumpridor exemplar da Constituição que ajudara
a escrever. Depois de 13 meses de estudos por vezes estafantes, aprovei
a tese da linha contínua”.
O
ex-Ministro enfatiza ainda o seu cuidado em integrar o Conselho de Defesa
nesse processo demarcatório: “Ressalvei no despacho a imperativa
necessidade de ser ouvido o Conselho de Defesa, quando da utilização
posterior da terra. E na Portaria 580 está assegurada a ação
e atuação das autoridades federais na área, um
bem da União”.
O
Procurador da República no Distrito Federal, Dr. Aurélio
Veiga Rios, sócio da Comissão Pró-Yanomami e defensor
de longa data dos direitos Yanomami, lembra também que “o
então Ministro das Relações Exteriores, justamente
mencionado no artigo do ex-Ministro Passarinho, como apoiador da demarcação
da área contínua Yanomami, era ninguém menos que
JOSÉ FRANCISCO REZEK, ex-Ministro do Supremo Tribunal e hoje
Juiz da Corte Internacional de Justiça em Haia-Holanda, sendo
considerado uma das maiores autoridades do Planeta em Direito Internacional
Público” (mensagem eletrônica aos sócios da
Comissão Pró-Yanomami de 27 de março de 2001).
A
íntegra do artigo do ex-Ministro Jarbas Passarinho pode ser encontrada
no home page do Estado de S. Paulo: www.estado.com.br
Transcrevemos
a seguir a matéria assinada pela presidente da Comissão
Pró-Yanomami sobre as declarações do Ministro Geraldo
Quintão e do Governador de Roraima, Neudo Campos.
POR QUE
NÃO DEIXAM OS YANOMAMI EM PAZ?
Alcida Rita Ramos
Notícias
veiculadas na grande imprensa brasileira, incluindo a Folha de S. Paulo,
na última semana, trazem de volta o fantasma que há quase
dez anos ronda a Terra Indígena Yanomami. Mais uma vez, setores
do Exército nacional e governantes do Estado de Roraima manifestam
sua vontade de regredir no tempo e acabar com a proteção
ao mais básico dos direitos dos Yanomami, ou seja, o direito
ao usufruto exclusivo de seu território, como reza a Constituição
Federal. Mais uma vez, vemo-nos obrigados a vir a público esclarecer
a todos e, em particular, a esses senhores, o que representa essa Terra
Indígena para os Yanomami e como sua demarcação
e homologação têm sido acatadas com irrestrito apoio
pelas autoridades máximas do país.
O governador de Roraima, Neudo Campos (PPB), foi citado nos jornais
declarando, desinformadamente, que não teria havido critério
para a demarcação da Terra Indígena Yanomami: "Eles
olharam o mapa e traçaram". Essa declaração
foi motivada pela visita a Roraima do Ministro da Defesa, Geraldo Quintão,
a propósito de acusações vindas de diversas fontes
de que membros dos batalhões do Exército instalados na
área de fronteira estariam seduzindo e engravidando mulheres
(algumas menores de idade) de várias etnias. Aproveitando a ocasião,
e extemporaneamente, o Ministro Quintão alimentou a desinformação
do governador ao classificar como "um erro" a decisão
do governo federal de demarcar a área em 1991.
Esta não é a primeira (embora esperemos que seja a última)
investida contra a Terra Indígena Yanomami. Em 1996, por exemplo,
a Câmara de Deputados apreciou o projeto de decreto legislativo
365, de 1993, de autoria do deputado Jair Bolsonaro, propondo a revogação
do "Parque" Indígena Yanomami. A argumentação
cuidadosa e bem fundamentada do relator, Deputado Fernando Gabeira,
derrubou o projeto.
Que saiba o Excelentíssimo Senhor Governador Campos que a demarcação
da área Yanomami foi o resultado de detalhadas pesquisas de geógrafos,
antropólogos e juristas que durante mais de uma década
acumularam dados históricos, etnográficos, ecológicos
e outros relevantes para chegaram com alto grau de precisão à
área que foi finalmente demarcada, homologada e registrada em
1991. Longe de ter sido um ato irrefletido e leviano de alguém
que, aleatoriamente, traça um risco no mapa, esse foi um trabalho
meticuloso e prolongado de profissionais altamente qualificados. Como
dever de casa, talvez o Governador pudesse tirar um tempinho de sua
atarefada vida pública para examinar o processo dessa demarcação
e evitar futuras gafes na frente de jornalistas.
O Ministro Quintão teria acrescentado que essa demarcação
deveria ser revista e discutida pela sociedade. O que parece que o Excelentíssimo
Ministro não sabe é que a Terra Indígena Yanomami
é o produto de discussões e negociações
que se estenderam por mais de 13 anos entre setores do governo e da
sociedade civil, que todo o processo representou um esforço conjunto
do Congresso Nacional, da Fundação Nacional do Índio,
do Ministério Público e do próprio Ministério
da Justiça com organizações não governamentais,
professores universitários, membros da Igreja e personalidades
de projeção nacional e internacional. Citemos apenas dois
exemplos.
O
falecido ex-Senador Severo Gomes foi um dos mais dedicados defensores
dos direitos dos Yanomami à terra que ocupam e que corresponde
à área demarcada. Também o ex-Senador, ex-Ministro
da Justiça e Coronel da Reserva do Exército, Jarbas Passarinho
não apenas apoiou plenamente a demarcação, mas
tem feito vários pronunciamentos públicos em favor da
manutenção da Terra Indígena Yanomami. Sua última
e brilhante defesa dos direitos territoriais Yanomami foi publicada
no Estado de S. Paulo no dia 27 de março, justamente em resposta
às apressadas declarações de Campos e Quintão.
Não
deixa de ser uma afronta aos poderes constituídos chamar de "erro"
algo que tem merecido repetidas manifestações de louvor.
Senão, vejamos: Em 1997, o Presidente da República, Fernando
Henrique Cardoso, outorgou à Comissão Pró-Yanomami
(CCPY), a ONG que desde 1978 lutou pela criação da Terra
Indígena Yanomami, o Prêmio de Direitos Humanos. Em 1999,
o Ministério das Relações Exteriores, sempre tão
zeloso da imagem e integridade do Brasil, condecorou o líder
Yanomami Davi Kopenawa com a Comenda da Ordem do Rio Branco. Essas demonstrações
de aprovação do Estado brasileiro, representado por ninguém
menos que seu próprio presidente e altos escalões diplomáticos,
reduzem a um infeliz lapso de impertinência as opiniões
apressadas de Campos e Quintão.
Declarar
publicamente que a demarcação oficial da Terra Indígena
Yanomami foi "um erro" é questionar a legitimidade
das autoridades máximas do país e, ao mesmo tempo, expôr
uma lamentável falta de afinação com o governo,
com a sociedade nacional, com a comunidade internacional e, não
menos importante, com o compromisso do Brasil para com suas minorias
étnicas.
Exposição
fotográfica de Claudia Andujar dedicada ao líder Yanomami
Davi Kopenawa fica em cartaz no Memorial da América Latina, em
São Paulo, durante o mês de abril.
A
fotógrafa e fundadora da Comissão Pró-Yanomami,
Claudia Andujar, faz uma retrospectiva de seu trabalho em exposição
que ficará em cartaz no Memorial da América Latina, durante
o mês de abril. O tema da exposição é a vida
tradicional Yanomami, organizada em três partes: A Casa; A Floresta;
O Invisível. O líder Davi Kopenawa Yanomami, xamã,
amigo, embaixador incansável na luta pela demarcação
da Terra Indígena Yanomami e pela integridade da Vida Yanomami,
será o homenageado especial.
O
trabalho foi selecionado visando a participação na II
Bienal de Fotografia de Curitiba, em 1998. Naquela ocasião, foi
editado um catálogo sobre a exposição, que estará
à venda no Memorial da América Latina. A exposição
já viajou pela Espanha e Portugal, em 1999, e será exibida
em São Paulo pela primeira vez, a partir do dia 06/04.
Não
há perigo de incêndio em Roraima, segundo o Ibama.
A
maioria dos focos de incêndio no Estado de Roraima foi extinta
pelas chuvas que começaram no dia 23/3. Esta é a informação
que consta do boletim nº 29, de 26.03.01, divulgado pelo Prevfogo
- Programa de Prevenção a Incêndios Florestais do
Ibama.
Segundo
o boletim, apenas no município de Amajari, onde a brigada anti-incêncio
continua de plantão, as chuvas não foram suficientes para
eliminar todos os focos. A umidade relativa do ar no Estado está
em torno de 60%. A coordenação das operações
de prevenção aos incêndios florestais em Roraima
está sob a responsabilidade do Comitê de Defesa Civil.