Ações
da Urihi melhoram saúde e reduzem taxa de mortalidade entre
os Yanomami
A
organização não-governamental Urihi-Saúde
Yanomami conseguiu, no ano passado, reduzir em 98% a incidência
de malária na população Yanomami por ela assistida.
Em 2000, essa doença chegou a atingir o índice de 47%,
em 2002, a percentagem caiu para 1,2% e nos primeiros quatro meses
deste ano, foram notificados apenas 11 casos de malária. De
2000 para cá, quando a Urihi iniciou seu trabalho junto aos
Yanomami, não se registrou uma única morte por malária
entre os Yanomami por ela assistidos.
“Esses
resultados são únicos na história da saúde
pública brasileira. Até então, não houve
qualquer precedente de redução da incidência de
malária em populações dispersas na Amazônia”,
revela o relatório da organização.
A população total Yanomami é estimada em 22 mil
pessoas, das quais cerca de 13,5 mil vivem no Brasil, distribuídas
em 350 comunidades no oeste do estado de Roraima e norte do Amazonas.
Até maio último, a Urihi prestou assistência direta
a 6.011 Yanomami distribuídos em 142 comunidades de nove diferentes
regiões, o que corresponde a 45% da população
residente no país. Atendendo a um convite do governo brasileiro,
neste mês de junho, o seu atendimento foi ampliado para 16 regiões,
abrangendo uma população de 7.110 índios (52,6%
da população total).
Durante estes três anos, a ONG teve como estratégia de
combate à malária a busca ativa, ou seja, a investigação
de casos novos, por meio do exame de pesquisa dos plasmódios
no sangue de toda a população ou, a qualquer momento,
quando surge um paciente com sintomas da doença. Nas comunidades
onde a incidência é alta, as investigações
passaram a ser feitas semanalmente. Desde o início de seu trabalho,
a Urihi já efetuou 263.377 exames de sangue para detectar malária.
As lâminas são colhidas e lidas diretamente nas aldeias
pelos profissionais de saúde ou pelos microscopistas Yanomami
formados pela Urihi.
Assim, os casos positivos são tratados imediatamente pelas
equipes de saúde que permanecem nas comunidades administrando
a medicação até o final do tratamento.
Entre 1991 e 1999, o diagnóstico dos pacientes com tuberculose
ocorria tardiamente. Em 1999 foram notificados 35 novos casos da doença
nas áreas atualmente atendidas pela Urihi que, desde a sua
chegada à terra indígena, implantou um novo sistema
de investigação e tratamento. São examinadas
todas pessoas com suspeita da doença e também os comunicantes,
por meio de teste tuberculínico (PPD), exame de escarro e radiografia
do tórax para todos os indivíduos com reação
forte ao PPD. Desde 2001, todos os casos diagnosticados são
tratados na aldeia do paciente, evitando a sua transferência
para Boa Vista. Antes os pacientes ficavam, no mínimo, seis
meses fora de suas comunidades, acarretando sérios transtornos
sociais. Todas essas mudanças permitiram que, nos últimos
três anos, a incidência da tuberculose entre os Yanomami
tivesse uma redução de 69% em relação
a 1999.
A Urihi implantou também um programa de saúde da criança
com o objetivo de enfrentar a alta mortalidade infantil. “O
acompanhamento do crescimento e desenvolvimento das crianças
com menos de cinco anos de idade tem revelado um estado de desnutrição
bastante acentuado. Nesta faixa etária, 65,7% das crianças
apresentam algum grau de desnutrição e 6,3% apresentam
desnutrição grave (peso inferior a 60% do normal para
a idade”, revela o relatório da Urihi.
As causas variam conforme a região, devido às diferenças
históricas, sociais e ambientais. O alto índice de mortalidade
registrado no final dos anos 80 e durante a década de 90 afetou
não somente a população infantil, mas também
os idosos.
Dentre
os fatores que concorreram para essa trágica situação
destacam-se os efeitos das atividades de garimpo que provocaram a
degradação ambiental, a redução da oferta
de recursos naturais e a mudança da dinâmica social produtiva
nas áreas por elas atingidas. Soma-se a isso a tendência
de sedentarização de algumas comunidades em áreas
próximas aos pólos-base, devido ao aumento da morbi-mortalidade
e falta de assistência à saúde nas aldeias no
passado. Sem a prática dos movimentos espaciais típicos
do padrão de assentamento tradicional, a concentração
prolongada em um mesmo local provocou o esgotamento das áreas
de plantio e dos recursos alimentares oferecidos pela floresta.
Mantendo o padrão de seriedade que tem caracterizado o seu
trabalho, a Urihi, no intuito de entender mais profundamente as causas
da desnutrição infantil, decidiu empreender uma pesquisa
específica para identificar os fatores de ordem médica,
social e ambiental responsáveis pelo problema. Essa pesquisa
será realizada ainda este ano por especialistas em antropologia,
saúde, nutrição e meio ambiente e deverá
trazer os subsídios necessários para a efetiva erradicação
da desnutrição infantil nas áreas por ela afetadas.
Nos últimos três anos, a Urihi conseguiu diminuir em
62% o coeficiente anual de mortalidade infantil. Comparando esse coeficiente
com os da década passada, verificamos que, de 156 a cada mil
habitantes por ano, a média atual caiu para 59/mil por ano,
sendo que, no primeiro quadrimestre de 2003, essa diminuição
foi ainda maior, atingindo o índice de 36,7. Hoje, o coeficiente
de mortalidade geral, que antes apresentava uma média de 22/mil
foi reduzido para 8/mil, o que significa uma queda de 64%. Atualmente,
a principal causa de morte são as infecções respiratórias
agudas que atingem, principalmente, a população infantil.
Foi implantado programa de combate à oncocercose, doença
também conhecida como “cegueira dos rios”. O tratamento
baseia-se na administração semestral do medicamento
ivermectina para toda a população nas áreas endêmicas
por um período de 12 anos. Apesar das complexas condições
operacionais do Distrito Sanitário Yanomami, o nível
de cobertura nos ciclos de tratamento da doença tem sido um
dos mais altos do mundo, recebendo reconhecimento internacional.
ONG
afasta risco de extinção da população
yanomami
Malária,
tuberculose, onconcercose, desnutrição infantil, verminose,
sarampo, gripe, coqueluche. O avanço desse conjunto de doenças,
até 1999, quase dizimou a população yanomami.
A explosão da malária na Terra Indígena Yanomami
provocada pela invasão maciça de garimpeiros, entre
o final dos anos 80 e início da década de 90, levou
à morte quase 15% dos Yanomami. Os indicadores epidemiológicos
revelavam que a sobrevivência dessa etnia estava seriamente
ameaçada pelas constantes epidemias e pelo altíssimo
índice de mortalidade que delas decorria. Face ao real risco
de extinção dos Yanomami, o governo brasileiro teve
que tomar providências urgentes de proteção.
Em 1991, demarcou a Terra Indígena Yanomami. A área
estava totalmente invadida por garimpeiros, atraídos pela notícia
da existência de grandes jazidas de ouro e de cassiterita na
área indígena divulgada pelo Projeto Radam. Com a demarcação
da área, o governo brasileiro lançou a Operação
Selva Livre para a retirada dos garimpeiros.
Diante da extrema crise de saúde que assolava os Yanomami,
chamando a atenção da imprensa nacional e internacional,
foi implantado o sistema de saúde que daria lugar à
criação do Distrito Sanitário Yanomami sob a
coordenação da Fundação Nacional de Saúde
(Funasa-Ministério da Saúde) e com a colaboração
de diversas outras instituições, incluindo ONGs. Era
a primeira iniciativa no país de funcionamento de um Distrito
Sanitário Especial Indígena. Mas as recorrentes invasões
de garimpeiros, a ausência de assistência no lado venezuelano
e, principalmente, as dificuldades do governo para garantir cobertura
médica a todas as comunidades marcaram a década de 90
com preocupantes indicadores epidemiológicos que continuavam
a pôr em risco a sobrevivência do povo Yanomami. Para
cada dois índios, um estava infectado pela malária.
Durante os anos 90, a doença foi a responsável pelo
maior número de mortes registrado.
Ao lado da malária, os Yanomami também foram vítimas
de outras doenças infecciosas, como tuberculose, infecções
respiratórias agudas e coqueluche, causadoras de elevados índices
de mortalidade. Os dados daquela época revelam que a média
do coeficiente de mortalidade infantil era de 157, cerca de cinco
vezes maior do que o índice verificado na população
brasileira. Se levarmos em conta que uma parcela expressiva dos casos
não foi notificada e que muitas aldeias ficavam sem qualquer
assistência durante meses, a situação deve ter
sido muito mais grave do que a revelada nos relatórios da década.
Várias dificuldades impediram que a Funasa desempenhasse satisfatoriamente
ações diretas de saúde nas comunidades indígenas,
sendo o Distrito Sanitário Yanomami o caso mais trágico
desse fracasso. As principais causas foram, por um lado, os obstáculos
impostos pela legislação que regula a seleção,
contratação e gerência de servidores públicos
federais e, por outro, a natureza específica do trabalho médico
em áreas indígenas. Os resultados negativos obrigaram
o governo a rever a sua estratégia e optar pela terceirização
das atividades de assistência às comunidades indígenas,
por meio de parcerias com organizações indígenas
e não-governamentais.
A partir de 2000, criaram-se algumas parcerias entre a Funasa e as
ONGs que, nos anos 90, haviam trabalhado com sucesso na assistência
aos Yanomami em suas regiões de atuação. O aproveitamento
da experiência profissional e da vocação indigenista
dessas ONGs marcaram o início da recuperação
das condições de saúde e de vida dos Yanomami.
Números
anteriores do Boletim da Pró-Yanomami-CCPY podem ser obtidos
no site www.proyanomami.org.br