Guarda
venezuelana invade território brasileiro na Terra Indígena
Yanomami
Recentemente
grupos de militares venezuelanos vêm invadindo o território
brasileiro, cruzando a fronteira internacional que constitui o limite
oeste da Terra Indígena Yanomami. O mais recente episódio
desta invasão ocorreu entre os dias 7 e 8 de junho passado.
Um militar venezuelano e um guia Yanomami da Venezuela fizeram uma
rápida incursão em território brasileiro até
uma aldeia chamada Poimopë, situada no alto rio Mucajaí.
No dia seguinte, um grupo de militares venezuelanos armados chegou
ao mesmo local e acampou numa casa coletiva dos Yanomami. Nesta aldeia
– situada na área de atuação da Urihi Saúde
Yanomami, ONG parceira da CCPY financiada pela FUNASA (Fundação
Nacional de Saúde) – o grupo impediu a auxiliar de enfermagem
de utilizar o rádio a fim de alertar o Pelotão de Fronteira
do Exército brasileiro sediado na região, em Surucucus.
A auxiliar foi interrogada sobre o trabalho que realizava no local
e a quem estava subordinada. Os militares venezuelanos ignoraram a
informação de que estavam em território brasileiro.
Pernoitaram na aldeia. Pela manhã, depois do grupo ter deixado
o local, a auxiliar de enfermagem constatou que uma mulher yanomami,
com várias escoriações, teria sido vítima
de abusos sexuais dos militares venezuelanos. Verificou ainda que
40 lâminas coletadas para diagnóstico de malária
tinham sido destruídas.
Na mesma ocasião, outra tropa de militares venezuelanos teria
se encontrada com cerca de 25 garimpeiros no lugar denominado Chico
Veloso – pista clandestina de garimpo – localizado no
alto rio Catrimani, em território brasileiro. Os garimpeiros
teriam sido torturados e saqueados pelos soldados venezuelanos. Em
depoimento à Polícia Federal, os garimpeiros teriam
se recusado a dar informações sobre o proprietário
da aeronave utilizada para o ingresso ilegal deles na área
indígena.
Estas recentes incursões da Guarda Venezuelana no país
levantaram a suspeita de que quatro índios Yanomami desaparecidos
em 2001 na região de Xitei poderiam ter sido seqüestrados
desta maneira . O seqüestro dos índios teria ocorrido
num lugar chamado Simoki, no início de outubro daquele ano.
Soldados venezuelanos teriam ingressado em território nacional,
espancado os índios e seqüestrado quatro deles para destino
ignorado. Os índios desde então não retornaram
à aldeia.
Diante destes fatos e relatos o Exército brasileiro montou
em regime de urgência uma operação para apurar
as atividades dos soldados venezuelanos em território nacional,
assim como para localizar acampamentos ilegais de garimpeiros na Terra
Indígena Yanomami. O grupo militar contou para estas operações
com o auxílio de índios Yanomami, conhecedores da região,
e de funcionários da CCPY.
A expedição percorreu entre 6 e 8 de agosto, a região
de Morohusiu (alto Mucajaí), ocupada por três comunidades
yanomami, muito próximas à fronteira Brasil-Venezuela.
A Guarda Nacional Venezuelana possui uma base ao longo da fronteira,
próxima a uma das aldeias situadas em território brasileiro,
com a população da qual mantém uma relação
aparentemente problemática. A expedição brasileira
constatou que os Yanomami manifestam muita insegurança diante
da presença militar, refletindo os problemas que vêm
enfrentando com as visitas recorrentes dos soldados venezuelanos.
As mulheres, sobretudo, escondem-se e os homens recebem os visitantes
na entrada de suas casas com desconfiança, não permitindo
sua entrada.
O temor dos Yanomami tornou-se ainda mais claro quando questionaram
os integrantes da expedição brasileira sobre o seu tempo
de permanência na aldeia. Mostraram-se preocupados sobre o que
poderia ocorrer quando a expedição partisse. Explicaram
que os soldados venezuelanos deviam ter escutado o vôo do helicóptero
utilizado pela expedição e, com certeza, iriam rapidamente
até a aldeia indígena para apurar o que havia ocorrido.
A questão destas incursões de soldados venezuelanos
no Brasil através da Terra Indígena Yanomami está
sendo também tratada no alto escalão do Governo Federal.
Assim, durante o período de 26 a 28 de agosto acontece no Ministério
das Relações Exteriores, com a presença de uma
delegação de 11 pessoas do governo venezuelano, a VIIª
Reunião do Grupo de trabalho sobre mineração
ilegal Brasil-Venezuela. Na pauta do encontro está prevista
uma discussão específica sobre o ingresso indevido de
militares venezuelanos em território nacional.
Ministério
Público cobra do Itamaraty providências sobre amostras
de sangue dos Yanomami armazenadas em laboratórios nos Estados
Unidos
A
Subprocuradora-geral da República e Coordenadora da 6ª
Câmara de Coordenação e Revisão (Comunidades
Indígenas e Minorias) do Ministério Público Federal,
Dra. Ela Wiecko de Castilho, cobrou da Divisão de Direitos
Humanos do Ministério das Relações Exteriores,
através de Oficio de 5 de Agosto, providências no sentido
de apurar a existência de amostras de sangue e de DNA Yanomami
em laboratórios de pelo menos cinco instituições
norte-americanas: Universidade Estadual da Pensilvânia, Universidade
de Michigan, Universidade de Emory, Universidade de Ilinois e Instituto
Nacional do Câncer – Instituto Nacional de Saúde.
A Subprocuradora quer ainda que o Governo brasileiro contrate um advogado
para obter o repatriamento dessas amostras e de todo o material genético
a elas associado, visando atender reivindicação dos
Yanomami transmitida a Procuradoria pelo líder e xamã
Yanomami Davi Kopenawa . Além disso, o Ofício pede que
seja verificada a possibilidade de o Governo norte-americano ou as
instituições depositárias serem acionados juridicamente
a fim de garantir indenização, por danos morais, às
comunidades Yanomami do Brasil, autoras da queixa.
No documento enviado à Divisão de Direitos Humanos do
Itamaraty a Subprocuradora cobra um posicionamento do Ministério,
lembrando que, em março último, já fizera a mesma
solicitação, sem que tenha obtido qualquer resposta.
O sangue dos Yanomami foi coletado no Brasil, no fim dos anos sessenta,
sem que tenha sido obtido adequadamente o seu consentimento informado.
Entre as comunidades submetidas à coleta de sangue em troca
de mercadorias encontram-se as aldeias da região de Toototobi
(AM), região de origem de Davi Kopenawa. Davi, então
com 11 anos, teve seu sangue coletado pela equipe americana do Dr.
J.V. Neel. Além disso, a partir do começo dos anos noventa,
as amostras de sangue yanomami foram reprocessadas com novas técnicas
de laboratório, permitindo a extração de material
genético. O DNA Yanomami esta sendo, assim, utilizado em novas
pesquisas genômicas novamente sem que o consentimento dos doadores
das amostras de sangue (ou de seus parentes, no caso dos que já
faleceram) tenha sido devidamente obtido.
A Subprocuradora Dra. Ela Wiecko de Castilho lembra ainda ao Itamaraty
que relatório da Associação Americana de Antropologia
(AAA) confirma a existência destas novas pesquisas científicas,
algumas já realizadas e outras ainda em curso: ver http://www.aaanet.org/edtf/index.htm
(Sobre esta questão
ver Boletins 25, 26 e 32 e Documentos Yanomami n° 2 no website
da CCPY: www.proyanomami.org.br - Pesquisa geral: digitar “sangue”
)
Polícia
Federal conclui inquérito sobre anúncio racista de jornal
de Boa Vista (Roraima) que compara Yanomami a animal
O
Procurador da República em Roraima, Dr. Carlos Fernando Mazzoco,
denunciou à Justiça Paulo César Cavalcanti Lima,
morador da capital do estado, Boa Vista, pela prática de racismo
contra o povo Yanomami, com base no que dispõe o parágrafo
2º do artigo 20 da Lei 7.716/89, que define os crimes resultantes
de preconceito de raça. Paulo César poderá ser
condenado à pena de reclusão de dois a cinco anos, além
de pagamento de multa.
Em novembro do ano passado, Paulo César publicou um anúncio
na seção “Animais” de Classificados do jornal
local Folha de Boa Vista., no qual colocava à venda “filhotes
de Yanomami, com um ano e seis meses” no valor de R$ 1 mil.
No inquérito, instaurado pela Polícia Federal, o acusado
afirmou que o anúncio era apenas uma “pegadinha”
que teria feito com um amigo (!).
O anúncio causou profunda indignação nos professores
Yanomami, então reunidos para um curso de formação
para o Magistério Indígena em Boa Vista. No dia seguinte
ao da publicação, um grupo de 22 deles divulgou uma
carta onde se diziam revoltados com o tratamento indigno dispensado
aos índios na cidade. Eles cobraram também o apoio da
Procuradoria Geral da República para que o povo Yanomami seja
tratado com respeito e que os culpados sejam processados. Finalmente,
os professores Yanomami exigiram que fossem tomadas providências
em relação ao jornal Folha de Boa Vista que permitiu
a publicação do anúncio racista. Esta última
reivindicação ainda não foi atendida.