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Yanomami expulsam quatro garimpeiros

Yanomami e CCPY reagem a críticas da Funasa

Yanomami criticam redução da terra dos Kayapó
Yanomami começam a obter documentos pessoais


Yanomami expulsam quatro garimpeiros

Um grupo de índios Yanomami, da região do Paapiú, prendeu, dia 1º de dezembro, quatro garimpeiros que invadiram a Terra Indígena por uma pista clandestina identificada como Feijão Queimado. Os invasores carregavam espingardas, munição e bastantes suprimentos – 30 quilos de feijão, igual quantidade de arroz e bananas. Os garimpeiros foram levados ao posto da Fundação Nacional do Índio e se recusaram a revelar para quem estavam trabalhando e quem os havia transportado até a área.

Conforme relato do líder João Davi Maraxi, aldeia Pakarapiu (Paapiú Novo), os invasores tentaram fugir e só não conseguiram graças à vigilância atenta dos Yanomami. Segundo ele, a captura dos invasores se deve a um novo comportamento adotado pelos índios. Hoje, os Yanomami estão mais conscientes da necessidade de vigiar o seu território e atentos a qualquer presença estranha na floresta. “Os napëpë (brancos) não desistem, por isso estamos atentos, vigiamos nossos rios, nossa floresta”, diz João Davi.

A presença dos garimpeiros provocou grande indignação entre os Yanomami, temerosos da possibilidade de recrudescimento das invasões em suas terras, com graves danos à saúde do grupo e aos seus recursos naturais. Segundo João Davi, os índios alertaram os garimpeiros que irão confrontá-los se estes voltarem a invadir suas terras. As discussões entre os Yanomami e os garimpeiros foram difíceis porque os índios falavam na sua língua e os garimpeiros não entendiam, embora João Davi servisse como tradutor.

A maioria dos índios advertiu os invasores de que a Terra Yanomami não lhes pertence. As mulheres também falaram na língua Yanomami, recordando a dor e as perdas que sofreram com a morte de filhos, maridos e velhos das aldeias, além dos danos causados aos recursos naturais, degradando a qualidade de suas vidas. Afirmaram que “nunca mais” terão amizade pelos garimpeiros.

João Davi deixa claro no seu relato que os índios da comunidade Kayanau, bem como os da Maloca Paapiú e do rio Mucajaí, não estão mais dispostos a tolerar os invasores. “Todos nós moramos ao longo de um único rio, por isso não queremos mais garimpeiros. Queremos apenas os enfermeiros, professores, aqueles que curam, ensinam e ajudam”, afirma o líder indígena.

Segundo ele, somente os profissionais da saúde e da educação são capazes de ajudar os índios a crescer, a acabar com as doenças, afugentando as epidemias, e levando escolas para as aldeias.”Nós conservamos e valorizamos os que agem assim conosco. Não queremos os que não ensinam, os que degradam as águas”.

Depois de dois dias no posto da Funai, os garimpeiros foram retirados da Terra Indígena Yanomami num avião da própria Funai. João Davi espera que os invasores estejam presos em Boa Vista e que não voltem mais à Terra Indígena.


Yanomami e CCPY reagem a críticas da Funasa

Brasília, 5 de dezembro de 2003

Nós, Yanomami, escrevemos este documento.
Esta é a nossa resposta escrita.

Depois de ter ouvido as palavras do chefe da FUNASA, todos nós ficamos zangados. Ele disse palavras ruins e não nos explicou nada. Por isso nós, Yanomami, não entendemos bem o que está acontecendo e estamos muito preocupados. Na verdade, não queremos ter de novo epidemias. Queremos também defender a URIHI-Saúde porque ela acabou de verdade com a malária e não queremos que ela seja afastada. Ela trabalha a sério e nos ensina a ser microscopistas e quer nos tornar bem informados. Por isso, consideramos que a URIHI-Saúde está muito bem e não queremos que vocês a afastem. Deixem ela trabalhar em paz.

Vocês da FUNASA chamaram a URIHI-Saúde, então não fiquem reclamando dela agora por causa de dinheiro. Em vez disso, trabalhem para acabar com as epidemias que nos matam a todos. É assim que nós, Yanomami, pensamos direito. Se não tiver mais remédio na mata, os Yanomami vão começar a morrer de novo e por isso estamos muito preocupados. Não sejam hostis com outros brancos que nos ajudam só por causa de dinheiro, porque eles só apóiam os povos indígenas brasileiros.

É isso que temos a dizer.

Davi Kopenawa Yanomami, liderança
João Davi MaraxiYanomami, liderança
Geraldo Kuesitheri Yanomami, agente de saúde

A FUNASA a ponto de desmantelar a assistência
de saúde aos Yanomami ?

Em 1999 o Decreto 3156 deu à Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) a responsabilidade de estabelecer e gerenciar as políticas de prevenção e de assistência à saúde dos índios em todo o Brasil.

Criou-se então no interior da FUNASA um departamento de Saúde Indígena (DESAI) com a incumbência de reestruturar essa assistência. De modo a descentralizar a sua execução, por meio de convênios firmados com organizações indígenas e indigenistas, foram criados 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) que organizam os serviços de atenção básica de saúde.

Quatro anos de experiência com esse modelo mostram no país inteiro uma considerável melhora na assistência e, conseqüentemente, na situação de saúde dos índios.

o Distrito Sanitário Yanomami (DSY), em particular, constata-se que nas áreas atendidas pela organização indigenista URIHI-Saúde Yanomami (conveniada com a FUNASA desde 1999), a mortalidade infantil foi reduzida em 65%. Em contraste com o período anterior à assistência da URIHI, ou seja, de 1991 a 1999, a malária foi reduzida em 99% e desde 2001 não houve nenhuma morte por essa doença nas áreas cobertas pela URIHI. Por sua vez, o número de casos de tuberculose caiu 60% em relação à década anterior.

Em vista dos resultados excepcionais com que a URIHI tem resgatado o bem-estar e a dignidade dos Yanomami após o rastro de destruição deixado pela invasão garimpeira em seu território, ficamos extremamente perplexos ao ler as declarações do Diretor do DESAI/FUNASA, Sr. Ricardo Chagas, de que as organizações não governamentais são “um poder paralelo que transgride a lei” (Folha de São Paulo, 20/10/2003).

Tal declaração, além de ofensiva e gratuita, preocupa-nos particularmente por sua inquietadora sintonia com a retórica das forças políticas retrógradas e corruptas do estado de Roraima contra as organizações indígenas e indigenistas.

Queremos lembrar que foi a FUNASA que convidou a URIHI-Saúde Yanomami e outras organizações indigenistas para assumir a assistência sanitária na Terra Indígena Yanomami depois de oito anos de gestão direta do DSY pelo órgão estatal. Esses oito anos levaram os Yanomami ao caos em termos de saúde, registrando-se os piores índices epidemiológicos e de mortalidade do país.

A FUNASA definiu as modalidades jurídica e administrativa dos convênios (lei 9.836 de 23/09/1999) pelos quais convocou as organizações indígenas e indigenistas a atuar complementarmente na execução de ações de saúde nas terras indígenas. Hoje, no entanto, a sua procuradoria jurídica questiona a legalidade dos convênios (parecer 501/PGF/FUNASA/GAB/2003), mas reconhece que “... a FUNASA, em face do sucateamento do órgão, não dispõe de quadros suficientes para exercer a mínima ação de controle das atividades”. Além disso, prossegue o parecer: “... caso a entidade privada paralise as atividades, a FUNASA não tem como contratar diretamente o pessoal e nem dispõe de estrutura logística para atender à população”.

Em vista disso, parece-nos que as declarações ofensivas e arbitrárias do Sr. Ricardo Chagas invertem os termos do real problema de gerência da saúde indígena, imputando as falhas do Estado às organizações não governamentais.

Para agravar ainda mais a situação, em vez de procurar debater construtivamente formas de aprimorar o modelo da Política Nacional de Saúde Indígena com as organizações indígenas e indigenistas parceiras da FUNASA, o Sr. Chagas cancelou abruptamente, no último dia 27 de novembro, o seminário “Gestão, Gerência e Organização dos Serviços de Saúde nos DSEIs”, programado para os dias 1 a 6 de dezembro em Brasília, com a participação de 150 funcionários do Ministério da Saúde (MS) e de 56 representantes de organizações não governamentais com as quais a FUNASA mantém convênios.

cancelamento intempestivo desse seminário mais as hostis declarações do Sr. Chagas parecem inaugurar uma crise aguda no gerenciamento da saúde indígena no país.

Chamamos a atenção para o fato de que a atitude precipitada e unilateral da FUNASA/DESAI de alterar o modelo atual de assistência à saúde dos povos indígenas torna-a responsável por atropelar o sistema de atendimento vigente, com os previsíveis riscos para as populações assistidas.

O passado recente nos ensina que políticas indigenistas equivocadas sempre põem o Estado brasileiro no banco internacional dos réus. Não queremos ver mais uma vez a mortalidade Yanomami voltar a freqüentar as manchetes nacionais e internacionais, cobrindo o país novamente de vergonha por conta da incoerência com a qual o Estado gere suas relações com as organizações indígenas e indigenistas, em especial aquelas que vêem complementando com competência e dedicação as ações estatais de saúde junto aos povos indígenas do Brasil.

Brasília, 5 de dezembro de 2003
Comissão Pró-Yanomami


Yanomami criticam redução da terra dos Kayapó

Os Yanomami divulgaram documento condenando a redução da Terra Indígena Baú, dos índios Kayapó, situada ao sul do Pará. A área, com 1,85 milhão de hectares, foi diminuída em 317 mil hectares (17,2%) por meio de portaria assinada pelo ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos.

No documento, os Yanomami da Aldeia Demini indagam os motivos da decisão do ministro em relação à terra Kayapó, demarcada desde 1991. “Por que diminuíram a demarcação da área Kayapó?”, questionam os Yanomami. Para eles, a decisão atende aos interesses daqueles que “degradam a floresta, as mineradoras e os madeireiros”. Para os Yanomami, esses grupos querem entrar nas terras dos Kayapó para explorar desenfreadamente seus recursos, retirar os minérios, cortar as árvores e trocá-las por dinheiro.

Para os Yanomami, a decisão do governo abre um perigoso precedente. O mesmo poderá ocorrer com a Terra Indígena Yanomami. Eles acreditam que o governo poderá ceder às reivindicações daqueles habitantes de Roraima que estão interessados em reduzir o tamanho de suas terras e, assim, abrir espaço para a ocupação pelas mineradoras.

O temor dos índios aumenta à medida em que políticos de Roraima começam a defender abertamente a revisão das áreas demarcadas, como é o caso vice-governador Salomão Cruz. Apesar de ser apontado como suspeito de envolvimento na operação Gafanhoto, responsável pelo desvio de R$ 320 milhões da folha de pagamento dos servidores do estado, o vice-governador preocupa-se em emitir declarações nos jornais locais que incitam os agricultores a recorrer ao Judiciário para questionar a demarcação de terras indígenas em Roraima.

Cruz afirma que, a partir da revogação do Decreto 22, que orientava a demarcação das terras indígenas, em Roraima, “algumas áreas demarcadas e homologadas com base neste decreto estão passíveis de revisão judicial, especialmente a de São Marcos e a Yanomami.”

A seguir a íntegra do documento dos Yanomami:

“Os Kayapó estão muito tristes, pois os napë pë diminuiram o tamanho da sua floresta. Por isso nós, Yanomami, escrevemos essas palavras.

No início a demarcação da floresta Kayapó era grande, em 1991 a área era larga mas, atualmente, os napë pë diminuíram muito o território.

Por que eles diminuíram a demarcação na área Kayapó? É dessa forma que agem aqueles que degradam a floresta, as mineradoras e os madeireiros. Eles querem entrar nas terras Kayapó, querem explorar desenfreadamente seus recursos. O que eles tencionavam fazer ao invadirem a área dos índios Kayapó? Não fiquem pensando sobre isso. Eles querem retirar minérios, por isso entraram. Por que os madeireiros querem entrar lá? Eles querem cortar as árvores, mas não as cortam à toa. Não pensem que eles cortam as árvores simplesmente sem motivos, eles querem trocá-las por dinheiro.

Há ainda outras palavras. Como nós Yanomami devemos pensar sobre essa questão? Os napë pë diminuíram as terras onde moram os Kayapó, por isso os habitantes de Roraima pensarão da mesma forma: “ Sim, nós aqui de Roraima, também queremos diminuir as terras dos índios Yanomami”. Depois que os roraimenses discursarem assim, as mineradoras pretenderão entrar em nossas terras. Por isso nós, Yanomami, devemos permanecer fortes.

As mineradoras também querem entrar aqui, em nossa floresta Yanomami, depois que também a diminuírem. Desta forma também pensam os roraimenses. Por isso, nós, Yanomami, permanecemos firmes. “As mineradoras não virão”, não pensem desta forma, elas certamente virão, por isso estamos avisando vocês.” (Palavras dos Watoriki thëri pë, Demini, dezembro de 2003.)


Yanomami começam a obter documentos pessoais

Como qualquer cidadão brasileiro, os Yanomami querem, há muito tempo, obter documentos pessoais, como carteira de identidade, CPF e passaporte. No entanto, persistentes entraves burocráticos têm-lhes impedindo o acesso pleno à cidadania no estado de Roraima. Porém, as dificuldades, que até agora pareciam intransponíveis, começam a ser superadas. A juíza Tânia Vasconcelos, da Justiça Móvel do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, está empenhada em solucionar o problema e liberar a documentação para os Yanomami. Assim, treze Yanomami já conseguiram tirar certidão de nascimento e carteira de identidade e outros dez estão prestes a obter também seus documentos.

A falta de documentos cria enormes empecilhos para que os Yanomami possam se deslocar dentro do país ou viajar ao exterior, quando são convidados por instituições internacionais. A cada viagem, eles ficam na dependência de uma autorização da Fundação Nacional do Índio. Além disso, os Yanomami que exercem atividades profissionais como professores e agentes de saúde, sequer podem, por não terem documentos, regularizar seus contratos de trabalho.


..Coordenação Editorial: Alcida Rita Ramos, Bruce Albert, Jô Cardoso de Oliveira


 

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