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Recém-chegada
em São Paulo, sem falar português, em 1956, Claudia Andujar encontrou
na fotografia a linguagem que poderia ajudá-la a decifrar e a se aproximar
de uma cultura e uma forma de organização social até então
desconhecidas. "Meu interesse sempre foi e continua sendo saber porque
as pessoas fazem o que fazem. O que gera o comportamento tem raiz na cultura,
mas tem fatores psicológicos também", diz.
Retratar algumas famílias brasileiras pareceu-lhe a forma mais eficaz
de conseguir penetrar nesse universo. Com uma abordagem que se assemelhava a
uma prospecção antropológica, Claudia iniciou seu trabalho
com o intuito de realizar um perfil sociológico do Brasil. As primeiras
imagens desse projeto foram feitas numa aldeia de índios bororos em Mato
Grosso em 1960, onde ela passou cerca de um mês.
Depois seguiram-se uma colônia de pescadores em Picinguaba, na divisa
entre Rio e São Paulo e as famílias de Diamantina (MG) e Guarulhos
(SP) e numa fazenda na Bahia.
Em todas as ocasiões, Claudia tentava ficar o máximo de tempo
possível. "Quanto maior o tempo de convivência, mais conseguimos
nos tornar invisíveis, o que é fundamental para obter imagens
mais próximas da realidade das pessoas. Infelizmente esse prática
não existe mais entre os fotógrafos. Hoje em dia, fora ensaios
publicados em livros, o que vemos em revistas e jornais são apenas relâmpagos.
Sobra pressa e falta humanidade." Essas imagens obtidas por Claudia há
40 anos denotam uma habilidade técnica, um domínio da composição
e da luz natural que revelam, ainda em estado bruto, uma fotodocumentarista
notável que se revelaria de forma contundente mais tarde, no seu trabalho
com os índios ianomâmis. Sua sensibilidade para captar as expressões
do humano é um marco na fotografia feita no Brasil.
Ao realizar uma reportagem sobre a Amazônia para a revista "Realidade",
no início dos anos 70, Claudia teve o primeiro contato com a comunidade
dos índios ianomâmis. Percebeu que seu trabalho precisava de uma
maior profundidade. Abandonou o trabalho nas redações, conseguiu
uma bolsa da Fundação John Simon Guggenheim e fez da questão
da demarcação das terras dos ianomâmis e da melhoria da
vida deles a sua bandeira.
Chegou a passar 14 meses consecutivos dentro de uma comunidade ianomâmi.
Fotografou os índios e seu entorno sistematicamente entre 71 e 76, até
ser expulsa pela Funai. "Era a época da ditadura. Disseram que eu
como estrangeira deveria ter interesses ocultos para estar entre os índios."
Fora da taba, a fotógrafa ajudou a fundar a ONG Pro Yanomami (www.proyanomami.org.br)
e tornou-se uma das vozes atuantes que levariam a demarcação das
terras ianomâmis em 1992. Para tanto, foi novamente perseguida e ameaçada
de morte, desta vez por garimpeiros impedidos de explorar ouro nas terras em
via de serem demarcadas.
No total foram 30 anos dedicados às questões indígenas.
"Muitos amigos diziam que eu não deveria deixar de fotografar quando
passei a agir politicamente. Hoje percebo que quando adquiri essa postura era
apenas uma outra forma de continuar enxergando as coisas, uma outra forma de
fotografar. Foi a coisa mais importante que fiz na minha vida", completa.
(Eder Chiodetto)