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Esta seção procura seguir toda a atualidade Yanomami no Brasil e na Venezuela. Apresenta notícias produzidas pela Pró-Yanomami (CCPY) e outras ONGs, bem como notícias de imprensa. Propõe também comentários sobre eventos, publicações, exposições, filmes e websites de interesse no cenário Yanomami nacional e internacional.

Yanomami na Imprensa

Data: 1 - Fevereiro - 2004
Titulo: O grande inimigo é a falta de assistência aos índios
Fonte: O Estado de São Paulo – Leonêncio Nossa

O sertanista Sydnei Possuelo, o mais destacado indigenista da atualidade, está viajando há mais de 30 dias por aldeias e povoados ribeirinhos da Amazônia. De lá, apesar das dificuldades de comunicação, acompanha os conflitos entre índios e proprietários rurais em Roraima e Mato Grosso do Sul. São temas aos quais está intimamente ligado.

Foi ele quem, na presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai), em 1992, iniciou o processo de criação da reserva Raposa Serra do Sol, no noroeste de Roraima. Ele concorda com a tese das Forças Armadas de que as áreas de fronteira estão ameaçadas por interesses estrangeiros. Mas, ao contrário dos militares, assegura que entregar terra a índio só reforça a soberania.

Para o indigenista, que na última eleição usou camiseta de campanha de Luiz Inácio Lula da Silva, um ano de governo petista não trouxe mudanças para os índios. "Não mudou absolutamente nada", diz, ao mesmo tempo que faz uma sugestão: "Meu querido presidente, enfia a cara dentro do País, olha mais o zé povinho."

Na Funai, Possuelo coordena o setor que cuida das tribos isoladas. Com 63 anos, dos quais 37 despendidos em ações na selva, ele mostra a mesma disposição para abrir trilhas na selva que tinha aos 19, quando participou pela primeira vez de um trabalho com os irmãos Orlando e Cláudio Villas Bôas.

Em entrevista ao Estado, ele avalia os principais problemas dos índios e constata enfurecido que uma "nova ameaça" à floresta e aos povos indígenas chegou à margem esquerda do rio Amazonas, no Pará. É o que chama de "praga" da soja. "O País está uma grande "sojeira", para não dizer sujeira."

Estado - Como o sr. avalia os conflitos em Roraima e Mato Grosso do Sul?

Sidney Possuelo - É um problema desesperador. Em Mato Grosso do Sul, muitos grupos indígenas vivem em abandono nas cidades, pois suas terras estão nas mãos de fazendeiros e posseiros. Tem sido histórica a ação dos brancos no alargamento das fronteiras econômicas, sempre deixando o índio numa situação extremamente difícil. Isso também ocorre em Roraima. Meu último ato na presidência da Funai foi reconhecer a terra indígena Raposa/Serra do Sol. A demarcação desta reserva deve ser contínua e não por ilhas. É um absurdo colocar entre uma aldeia e outra elementos que vão dificultar a existência ou trânsito dos índios. Hoje a situação na área está pior porque cooptaram parte das lideranças indígenas. Os índios vivem ali em vários graus de aculturação, todos com grande relacionamento com a sociedade nacional. Nessa caso, o que permanece é a nossa eterna incompreensão. Os brancos se enchem de autoridade moral e saem dizendo aos quatro ventos que a terra está com sua família há três gerações. Mas quantos há anos os índios estão nessa terra ? Dois, três ou quatro mil anos? Que direito nós temos de tirar deles o direito ao sustento ?

Estado - Qual é a análise que o sr. faz da ação do governo relação à criação da reserva Raposa Serra do Sol?

Possuelo - Não foi uma boa idéia do governo divulgar que a terra seria homologada. Nunca houve divulgação antecipada de um ato automático, que ocorre após a demarcação. Acho que houve má intenção da parte de quem divulgou essa informação. Não é a homologação que caracteriza ou justifica a terra indígena. O que justifica é a presença e a ocupação do índio. Demarcar e homologar são simples reconhecimentos de que os índios estão na área. O processo de demarcação de Raposa foi concluído, publicado no Diário Oficial.

Uma vez demarcada, os atos seguintes são protocolares. Já teve o momento de contestação na Justiça.

Estado - Há uma solução para o problema das famílias que têm índios e brancos, que vivem naquela área?

Possuelo - O parâmetro usado para demarcar a terra foi de população indígena. Agora, levantam essa questão dos brancos. Geralmente, os brancos aproveitam a situação. Um branco quando casa com uma índia vai morar no território indígena. Quando é o contrário, um índio casa com uma branca, é raro o homem sair. Eu acho que os próprios povos indígenas vão resolver isso. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A demarcação deve ser inteira e integral. Os índios não deixaram os brancos entrarem? Qual é o problema de os brancos continuarem lá? Se vivem em harmonia, eles não devem necessariamente sair.

Estado>/b> - O senhor leu os relatórios das Forças Armadas alertando para o risco que a reserva pode trazer para a segurança nacional?

Possuelo - É a reação esperada. Os militares também foram contrários à demarcação da terra ianomâmi, nos anos 90. Não espero que tenham evoluído a ponto de entenderem tão rapidamente a questão da (reserva) Raposa/Serra do Sol. É claro que as ocupações (nessa reserva) são diferentes. Na área ianomâmi não havia núcleos de brancos. Não consigo ver os povos indígenas como uma ameaça à soberania nacional. A demarcação não separa o Brasil das terras indígenas. As terras não são propriedades dos índios, mas da União. O que você tem hoje nessas áreas de fronteira? Terra devoluta, fazenda que ninguém controla, narcotráfico, guerrilha, bandido, o diabo a quatro. O grande inimigo nessas regiões é a falta de assistência aos indígenas. É essa presença do Estado que cria nas regiões mais distantes, nessa Amazônia esquecida, o sentido de brasilidade. Não é só falar português que cria esse sentido. Muitos brasileiros dominam perfeitamente a língua e vivem roubando a União. Nós devemos ter medo da falta de assistência ao índio. Quando alguém passar por lá e der uma aspirina ao índio, ele vai chamar de amigo.

Os índios de Raposa/Serra do Sol foram considerados súditos do Império e integraram tropas. Graças a eles, o Brasil conseguiu evitar o domínio da região pelos holandeses e franceses. Os índios foram importantes na consolidação e conquista do território nacional. Hoje, não conseguem ter sua terra demarcada de forma contínua.

Estado - Diante das limitações na Funai e no Ibama, a criação da reserva garantirá a presença do Estado na região?

Possuelo - Quando o Estado for totalmente ausente em saúde, educação, e terceirizar tudo, aí sim, eu estarei de acordo com o Exército de que haverá um sério problema para a segurança nacional. Acredito que a falta de assistência abre portas para o desespero, do homem indígena ou não. Isso também se aplica ao ribeirinho, ao amazônida. A Funai não faz nada, o Ibama não "ibama" coisa nenhuma. Existem pessoas honestas e competentes dentro da Funai e do Ibama querendo fazer alguma coisa, mas não dispõem de meios nem de recursos. Rapazes são contratados por terceirização, falam um monte de coisas, ficam seis meses no cargo e depois saem. Esses órgãos estão sendo destruídos há tempo. Hoje, a gente fala com certa vergonha, baixinho: trabalho no Ibama, na Funai, na Funasa. Nada disso parece ser preocupação de governo. O fim da figura do funcionário público tem sido marca dos últimos governos. E a questão indígena está nesse caldo.

Estado - Que lhe parecem as ações do governo nas áreas ambiental e indígena?

Possuelo - Até agora não mudou absolutamente nada. O presidente passou o primeiro ano olhando muito para fora. Ele olhou a área econômica. Foi preciso olhar, sim, as questões de mercado, o pagamento da nossa dívida, o equilíbrio da balança. Agora, meu querido presidente Lula, enfia a cara dentro do País, olha mais o zé povinho. Dentro das condições econômicas que o seu governo e o anterior conquistaram, vamos agora ver o que nós podemos reverter e mudar. Afinal, um trabalho negativo na área ambiental pode ter um peso terrível no exterior. Nós não ficaremos impunes, por exemplo, com essa soja transgênica.

Estado - Qual é o seu temor em relação à soja?

Possuelo - A soja é uma praga. Tenho medo dela pois come extensões imensas e não precisa de solos ricos. O Brasil possui a Amazônia, que é uma maravilha cada vez mais importante, com 22% da água potável do planeta. Zelar por esse bem talvez não renda bônus imediatamente, mas com certeza é um fator que facilita outras negociações. Hoje, na área ambiental há uma parafernália de palavras modernas, de projetos auto-sustentáveis, mas se faz o que sempre se fez: derrubar a floresta. Só mudou a retórica. Falo mal do meu país aqui entre nós. Não gosto de falar mal lá fora. Agora, não sou burro de tapar o sol com a peneira, pois corro o risco de ficar desacreditado.

Estado - Os migrantes que chegam do Sul são um risco para a floresta amazônica?

Possuelo - O migrante sai para melhorar, investir, ficar milionário. Ele é sempre um perigo, são raras as exceções. O homem vem sempre para conquistar.

É uma coisa bíblica, tudo foi colocado à disposição do homem para ser conquistado. Deus colocou o homem no mundo para reinar sobre tudo. E o nosso reinar significa o poder da vida, da morte, da destruição. Isso também ocorreu na conquista da América pelos espanhóis, nas conquistas inglesas na África e na Ásia. O meu amigo migrante pode contribuir muito, vir com tecnologia e recursos, mas pode também destruir tudo. O sul do País cultivou muito essa coisa de exploração. Além disso, o sulista não vem para o Norte como um nordestino vai para São Paulo. Ele já vem com um bom capital. O Sul e o Sudeste do Brasil concentram o que há de melhor da nossa sociedade, porém a mentalidade é a mesma de leste a sul. O problema é a eterna disputa pela terra. Até hoje não conseguimos dar sossego e tranqüilidade ao índio.

Estado - São boas as propostas em debate no Congresso para a área indígena, em especial a exploração de recursos minerais nas reservas?

Possuelo - Não é preciso fazer novas leis. O que já existe é ótimo. Não acredito que o Congresso faça uma lei que beneficie mais os índios do que já está garantido. Se sair alguma coisa nova é para tirar direitos.

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Coordenação Editorial: Bruce Albert (Assessor Antropológico CCPY) e Luis Fernando Pereira (Jornalista CCPY)


 

 

 


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