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Notícias CCPY Urgente
Data: 2 - Setembro - 2004
Titulo: Yanomami avaliam primeiro mês de atuação das equipes da Funasa
Fonte:
CCPY – Comissão Pró-Yanomami, Boletim nº 53
Líderes, professores e microscopistas yanomami da região
do Parawau reuniram-se no fim de julho para uma primeira avaliação
do atendimento prestado na sua região pelas equipes da Fundação
Nacional de Saúde (Funasa) que, a partir de 2 de julho, reassumiu a responsabilidade
pelo atendimento na Terra Indígena Yanomami. Comparando a qualidade do
atendimento da Funasa à da ONG Urihi-Saúde Yanomami que os atendia
desde 1999 com resultados muito positivos, os habitantes de Parawau mostraram
grande paciência ao aconselharem os servidores da Funasa a serem mais
dinâmicos em campo do que demonstraram ser no primeiro mês de atuação.
Recomendaram que fiquem menos no Posto, esperando os doentes aparecerem, e passem
a percorrer ativamente as aldeias para identificarem os pacientes e administrarem
os tratamentos adequados, evitando que a malária, as gripes e outras
doenças voltem a provocar mortes nas aldeias.
Chamamos a atenção para o modo maduro como os
Yanomami expressam à Funasa a expectativa de que o modelo de atendimento
à saúde instaurado pela Urihi deve ser continuado. Ao contrário
da sua experiência anterior com a Funasa, os Yanomami estão agora
em posição de avaliar a qualidade do atendimento à saúde.
Na reunião, redigiram uma carta à Funasa na
qual advertem: “Vocês da Funasa não trabalham como trabalhavam
antes os da Urihi, mas nós vamos tentar corrigir isso”. Em outro
trecho, eles evocam as experiências anteriores: “Nós não
queremos que nossos filhos morram, elas já morreram demais no passado...
Não sejam preguiçosos”. Apresentamos abaixo a íntegra
da carta dos Yanomami à Fundação Nacional de Saúde:
Parawau, Posto Yano, 27 de julho de 2004.
A vocês da Funasa.
Digam o que vocês pensam sobre a nossa atual situação,
nós queremos esclarecer isso. Não há carne de caça
aqui, mas nós fizemos o que chamam de reunião, é uma tentativa
de acertarmos o que está acontecendo. Como nós pensamos sobre
os brancos que estão trabalhando com a nossa saúde agora? Nós
não pensamos à toa, porém não temos ainda uma opinião
definitiva.
Vocês da Funasa não trabalham como trabalhavam
antes os da Urihi, mas nós vamos tentar corrigir isso. Os brancos da
Urihi trabalhavam bem. Se estávamos com saúde aqui, eles seguiam
para outra casa onde houvesse doenças, sem pressa de retornar para o
posto. Era assim que eles faziam, trabalharam muito em outros lugares. Depois
de curarem os outros Yanomami, somente após isso, eles retornavam para
casa. Eles também detectavam doenças lá longe, entre os
Maxapipiwei teri pë, era assim que eles faziam, os da Urihi. Vocês
da Funasa não fazem da mesma forma que a Urihi fazia no passado, mas
nós vamos insistir para que melhorem. Se hostilizarmos os da Funasa à
toa, não virão outros brancos aqui para nos curar. Por isso fizemos
esta reunião, para tentarmos conscientizá-los.
Se não dissermos “Ajudem-nos, vocês
da Funasa”, vocês não nos ajudarão, vocês não
nos responderão. Talvez vocês digam “não, os Yanomami
não pensam direito”. Nós dizemos: “Nós não
queremos que nossos filhos morram, eles já morreram demais no passado”.
“Não sejam preguiçosos”, “vá até
minha casa”. Quando falamos desta forma, vocês devem ir. Vocês
da Funasa que entraram na nossa terra, não sejam preguiçosos.
Nós estamos vigiando, estamos atentos, de olho
na administração de remédios. Nós estamos observando
diretamente se a pneumonia acaba, se nos curam bem. Agora, se o pessoal da Funasa
ficar bravo à toa, afugentar crianças e também reclamar,
aí vamos ter vontade de nos livrar deles. Se não nos curarem,
não será nada bom.
A Urihi trabalhava assim: eles iam para o Koherepi, para
o Uxiximapiu, para o Maxapipi, para o Raharapi, para o Etewexipi. Era assim
que a Urihi atuava, por isso os Yanomami ficavam realmente muito felizes. Mas
a mulher da Funasa nos mandou para trabalhar para eles. As crianças estavam
doentes, mas a mulher da Funasa nos fazia trabalhar. “Come peixe!”.
“Depois de comer, você deve curar as crianças”, nós
lhe dissemos. Se não curarem nossos filhos, não queremos trabalhar
com vocês e vamos querer dizer que “a Funasa não é
boa”. Isso vai acontecer se nossos filhos morrerem de pneumonia ou de
outras doenças. Aí, não queremos mais ter vocês da
Funasa por aqui. “Vamos chamar outros brancos realmente bons”, é
isso que vamos dizer, se isso acontecer.
Nós também dissemos aos da Funasa que foram
à nossa casa: “Vocês devem trabalhar como faziam os da Urihi
até recentemente”. Mas eles nos chamaram de preguiçosos
quando não fomos pescar para eles, após dizerem “estou com
fome”.
Outro assunto. Há microscopistas entre nós,
Yanomami, mas se não tiverem o que fazer, a situação vai
piorar, por isso queremos voltar a atuar com a Funasa. As coisas ficarão
boas quando voltarmos a trabalhar como na época da Urihi. Ainda lemos
lâminas, ainda sabemos ver a malária. Nós queremos continuar
a trabalhar, mas não nos dão o que fazer. Vocês também
estão inativos, por isso estamos tristes.
Os Yanomami que discutiram esse assunto foram:
Geraldo Wanapiu teri, conselheiro local;Edu Xakipi teri; Ivo Xakipi teri; Vitor
Koherepi teri; Atapae Parawau teri; Topo Parawau teri; Cassio Etewexipi teri;
Carlos Etewexipi teri; Aroldo Etewexipi teri;Robi Etewexipi teri; Adão
Uxiximapiu teri.
Os microscopistas e professores Yanomami que estiveram
presentes na reunião foram:
Hugo Koherepi teri, microscopista; Zeca Parawau teri, microscopista; Edson Uxiximapiu
teri, microscopista;Esmeraldo Etewexipi teri, microscopista; Ivan Yoroana, Xotokomapiu
teri; professor Rafael Wanar; , Wanapiu teri, professor;Apolo, Xotokomapiu teri,
professor; Eberson Koimari, Raharapi teri, professor;
Outros Yanomami presentes:
Romeu Uxiximapiu teri; Hélio Wanapiu teri; Tanera Maraxipora teri; Biko
Etewexipi teri
(Traduzida do Yanomami pelo professor Luis Fernando Pereira)
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Coordenação Editorial:
Bruce Albert (Assessor Antropológico CCPY) e Luis Fernando Pereira (Jornalista CCPY)
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