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Notícias CCPY Urgente
Data: 23 - Fevereiro - 2005
Titulo: Yanomami do Amazonas denunciam impacto da pesca predatória nos rios da Terra Indígena Yanomami
Fonte:
CCPY – Comissão Pró-Yanomami, Boletim nº 61
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Depois
da degradação ambiental provocada pelos garimpeiros - muitos ainda
atuando na Terra Indígena - os Yanomami estão enfrentando hoje
a entrada de pescadores profissionais nos seus rios, o que vem sistematicamente
empobrecendo os recursos alimentícios de suas comunidades. Em carta dirigida
ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais (Ibama), um
importante grupo de Yanomami do Amazonas denunciou a pesca predatória
em grande escala para comercialização pelos brancos no rio Komixiwë
(Marauiá), ulitizando redes (“malhadeiras”).
No
documento de 27 de janeiro 2005, eles denunciam também a omissão
dos fiscais do Ibama. “Pensávamos que os bancos do Ibama fossem
corajosos e valentes, que eles morariam onde desemboca o rio Komixiwë (Marauiá),
para proteger suas águas, mas eles apenas fizeram sua casa e a abandonaram.
Estes brancos diziam que nos ajudariam a proteger o rio, que vigiariam suas
águas e deixariam os peixes passarem. Foi assim que fizeram, mas depois
abandonaram suas casas, para onde foram estes valentes brancos? Não existem
mais brancos valentes que vigiam o rio”.
Os
Yanomami afirmam que a situação está “muito ruim”
e ameaçam cortar as redes dos pescadores que, mesmo quando agem no limite
da Terra Indígena, represam a passagem dos peixes para os rios do território
indígena e, assim, reduzem drasticamente a disponibilidade de peixes,
produto essencial à dieta alimentar das comunidades yanomami da região.
Os assinantes da carta reivindicam ainda que o Ibama coloque fiscais na região
para impedir a pesca predatória entre o baixo rio Marauiá e o
rio Negro.
Segue-se
na íntegra a carta assinada por líderes, professores, agentes
de saúde e moradores yanomami da região do Marauiá.
Bicho
Açu, 27 de janeiro de 2005.
Nós,
Yanomami, queremos enviar para longe nossas palavras, por isso fizemos este
documento. Nascemos e crescemos na região do Marauiá, estamos
atentos ao que ocorre aqui, por isso estamos lhes informando sobre o que está
acontecendo. Sabemos o que falar, nosso pensamento é vasto e abrangente.
Os brancos estão acabando com nossos peixes, os peixes do rio Komixiwë
(rio Marauiá). “Vocês brancos não devem acabar com
nossos peixes! Não teimem em fazer isso! Somente nós, Yanomami,
deveríamos comer os peixes do rio Komixiwë, pois passamos fome (de
carne), as crianças também passam fome! Queremos tomar caldo de
peixe! Vocês, brancos, devem comer os peixes dos locais onde moram! Vocês
podem pescar e comer os peixes do grande rio Negro, próximo de onde moram,
não teimem em acabar com nossos peixes”, é o que nós
pensamos.
Não queremos dividir os peixes desta forma, comê-los junto aos
brancos. “Esse nosso rio é de onde nossos pais retiraram os peixes
com os quais se alimentaram, nós também descemos este rio nos
alimentando desses peixes”. Quando morávamos no alto rio Marauiá,
nós nos alimentávamos com esses peixes, nós os comíamos
com bananas. Pescávamos também piranhas. Era o que comíamos
antes de conhecermos os brancos.
Quando os nossos pais desceram o rio, encontraram com um branco chamado Emílio,
com quem travaram relações amistosas. Nesta época, eles
não conheciam os brancos. Emílio subiu o rio para nos visitar;
foi quando vimos o rosto do branco pela primeira vez.
Nós não conhecíamos a face do branco, agora já a
conhecemos, sabemos o que pensam e o que pretendem, por isso estamos alertas
quanto aos peixes deste rio. “Ei ! Vocês, brancos, devem ficar nos
seus rios, não venham acabar com os peixes daqui”, é o que
dizemos.
Nós já amadurecemos, nossa forma de pensar se ampliou, por isso
não queremos ver esses brancos aqui em nossa floresta. Nossos avós,
que já comiam os peixes do rio Komixiwë (Marauiá), utilizavam
a casca da árvore xinakotorema para pescar piranhas. Eles faziam anzóis
com os ossos do macaco coatá para pescar peixes. Antes dos brancos aparecerem,
nossos avós não comiam sal, eles saboreavam a comida pura. Não
havia sal entre os alimentos que comíamos no passado. Também assávamos
piranhas embrulhadas em folhas de açaí. Foi com o caldo desses
peixes que eles nos fizeram crescer saudáveis.
“Onde estão os brancos, para onde eles vão”, era o
que constantemente pensavam nossos pais. Quando os brancos subiram o rio Aracá,
os Yanomami conseguiram terçados com os quais fizeram também uma
espécie de machado. Depois de conseguirem os terçados, eles abriram
roças e plantaram sementes de pupunha.
Na região rio acima, quando os igarapés secavam, os Yanomami comiam
peixes tamoatá. Comiam também frutas baraturi. Foi com esses peixes
que nossos pais nos criaram, nos fizeram crescer, por isso não queremos
que os brancos acabem com eles. “Onde comeremos, quando tivermos fome
de carne”, é o que pensamos. Onde poderemos flechar animais para
comê-los? Pensamos desta forma, por isso não queremos que os brancos
acabem com os peixes. Este é o nosso costume, a nossa forma de viver.
No início, pensávamos que os brancos do Ibama fossem corajosos
e valentes, que eles morariam onde desemboca o rio Komixiwë (Marauiá)
para proteger suas águas, mas eles apenas fizeram sua casa e a abandonaram.
Estes brancos diziam que nos ajudariam a proteger o rio, que vigiariam suas
águas e deixariam os peixes passar. Foi assim que fizeram, mas depois
que abandonaram sua casa, para onde foram estes valentes brancos? Não
existem mais brancos valentes que vigiam o rio, foram-se e a casa permanece
vazia.
Hoje, quando nós vamos pescar, não conseguimos peixes. “Onde
estão os peixes”, nós perguntamos aos que pescam. “Os
peixes não mordem mais o anzol”, eles respondem. “Ah, é
porque os brancos acabaram com os peixes do rio”, é o que pensamos.
“Huuu, sim meu pai! A situação ficou muito ruim, por isso
vamos cortar as malhadeiras dos brancos”, foi o que já dissemos.
“Meu pai, quando formos novamente, destroçaremos as malhadeiras”.
Os brancos estão pescando fora da área Yanomami, mas eles fecham
as margens do rio com malhadeiras, por isso não deixam que os peixes
passem e cheguem até onde moram outras comunidades nossas, rio acima.
Os brancos pescam e levam para longe esses peixes, pois querem vendê-los
para outros.
Este pedido não é porque cobiçamos mais terra, queremos
apenas que vocês ajudem a proteger o baixo rio Komixiwë (Marauiá)
dos brancos que insistem em acabar com nossos peixes. Pedimos, com estas palavras,
que o Ibama coloque pessoas para vigiar essa região do rio Komixiwë
(Marauiá), até onde desemboca no rio Negro. Com este documento
que escrevemos, solicitamos que vocês mandem fiscais. Se o Ibama enviar
fiscais para vigiar e proteger o rio, fará com que os peixes voltem a
passar.
Assinam
lideranças, professores, agentes de saúde e moradores do Marauiá:
Renato Yanomami, Gabriel Yanomami, Martinho Yanomami, João Yanomami,
Domingos Yanomami Ironasi teri, Henrique Yanomami, Joana Yanomami, Alípio
Yanomami, Francisca Yanomami, Alberto Yanomami, Mateus Yanomami, Alda Yanomami,
Damião Yanomami Iximau teri, Osmar Yanomam Iximau teri, Euzébia
Yanomami Iximau teriyoma, André Yanomami, Sabá Yanomami, Rubens
Yanomami,Celestina Yanomami, Joãozinho Yanomami, Mariota Yanomami, Rubens
Yanomami Pohoropiwei teri, Maria Yanomami, Paula Yanomami, Dalvinha Yanomami,
Naciota Yanomami, Rui Yanomami, Elizeu Yanomami, Mateus Yanomami Xamatau teri,
Pirina Yanomami, Paulinho Yanomami, Virginel Yanomami, Terezinha Yanomami, Carlinhos
Yanomami, Cassiano Yanomami, Batista Yanomami Iximau teri (professor), Manoel
Yanomami Ironasi teri (professor), Marielza Yanomami Pukimapiu teriyoma (professora),
Vitorino Yanomami Iximau teri (professor), Vicente Yanomami Ironasi teri (professor),
José Yanomami (agente de saúde), Janete Yanomami (agente de saúde),
Emerson Yanomami Pukimapiu teri (professor), Ferreira Yanomami Xamatau teri
(professor), Daniel Yanomami, Raita teri (professor), Daniel Yanomami Ironasi
teri (professor), Cláudio Yanomam, Pukimapiu teri (professor), Hipólito
Yanomami Pukimapiu teri (agente de saúde), Lico Yanomami Raita teri,
Elizeu Yanomami, Luiza Yanomami, Lucina Yanomami, Auria Yanomami, Rute Yanomami,
Laura Yanomami, Margarida Yanomami, Almir Yanomami, Mariana Yanomami, Cleonice
Yanomami, Antônio Yanomami, Irene Yanomami, Jorgina Yanomami, Helena Yanomami,
Vanda Yanomami, Rita Yanomami, Sueli Yanomami, Fátima Yanomami, Adriana
Yanomami, Samuel Yanomami, Catarina Yanomami, Gilberto Yanomami, Ana Yanomami,
Paulo Yanomami Ironasi teri, Telma Yanomami Ironasi teriyoma, Otávio
Yanomami Ironasi teri.
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Coordenação Editorial:
Bruce Albert (Assessor Antropológico CCPY) e Luis Fernando Pereira (Jornalista CCPY)
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