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Notícias CCPY Urgente
Data: 5 - Maio - 2005
Titulo: Mobilização reúne mais de 700 líderes de 89 povos indígenas
Fonte:
CCPY – Comissão Pró-Yanomami, Boletim nº 63
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Mobilização
reúne mais de 700 líderes de 89 povos indígenas
A
mobilização Terra Livre, organizada pelo Fórum de Defesa dos Direitos Indígenas
(FDDI), promoveu o maior acampamento indígena da história de Brasília. Foram
25 malocas, construídas com palha de coqueiro, organizadas em círculo, reunindo
mais de 700 representantes de 89 povos indígenas, em plena Esplanada dos Ministérios.
Foi o principal ato do movimento Abril Indígena para forçar o diálogo com
o governo federal e exigir o atendimento das principais reivindicações das
comunidades indígenas do País, agrupadas em quatro grandes grupos temáticos:
1) saúde, educação e regularização das terras indígenas;
2) manutenção e respeito aos direitos e conquistas inseridos
na Constituição, bem como da legislação infraconstitucional (Estatuto dos
Povos Indígenas);
3) criação do Conselho Nacional de Política Indigenista,
como órgão normativo e fiscalizador de uma nova política; e
4) gestão territorial e sustentabilidade das terras indígenas.
Durante a semana do acampamento, os líderes cumpriram uma agenda de discussões
com os poderes Executivo e Legislativo, a fim de garantir o atendimento de
suas propostas. No encerramento das atividades, foi aprovada a Carta da
Mobilização Nacional Terra Livre – Abril Indígena. Apresentamos a seguir
a íntegra do documento:
Carta
da Mobilização Nacional Terra Livre - Abril Indígena
Nós, as mais de 700 lideranças indígenas abaixo assinadas, representantes de
89 povos indígenas de todo o Brasil, reunidos em Brasília no Acampamento Terra
Livre, entre os dias 25 e 29 de abril de 2005, consideramos esta mobilização
a mais significativa realizada pelos povos indígenas do Brasil desde a triste
comemoração dos 500 anos em Porto Seguro, no ano 2000.
A presente mobilização consolidou uma aliança nacional entre dezenas de povos,
organizações indígenas e entidades indigenistas, com o objetivo comum de defender
e garantir a efetividade dos direitos indígenas no Brasil, o que renova a nossa
esperança na conquista de dias melhores.
Vimos a seguir apresentar à sociedade brasileira, ao Governo Federal, ao Congresso
Nacional e ao Poder Judiciário, os resultados das reuniões plenárias e audiências
com autoridades realizadas durante esta mobilização nacional, em respeito aos
4 grandes eixos por nós reivindicados.
1.
Nova Política Indigenista
- a
ausência da participação dos povos indígenas e de representantes da sociedade
civil na definição da política indigenista resulta hoje em ineficiência
das ações governamentais voltadas às populações indígenas;
-
sabemos que a elaboração e implementação da política indigenista hoje é
de competência de vários órgãos de Estado (Ministério da Justiça, Saúde,
Educação, Meio Ambiente, Desenvolvimento Agrário, Desenvolvimento Social,
Funai, Incra, Conselho de Gestão do Patrimônio Genético- CGEN e outros);
- para
maior eficiência na execução dessas políticas é necessário que exista um
órgão com competência para coordena-las;
-
reivindicamos para isso a criação do Conselho Nacional de Política Indigenista,
que deverá ser composto por representantes dos povos indígenas, das entidades
de apoio à causa indígena e do Governo Federal, e que terá poder para coordenar
as ações governamentais dos vários Ministérios voltadas aos povos indígenas;
-
o Conselho deve estar vinculado a Presidência da República;
-
o Conselho deve ter competência deliberativa, portanto ser criado por Lei;
-
o Governo Federal, por meio dos Ministros Márcio Thomas Bastos, José Dirceu,
da Casa Civil, e Luiz Dulci, da Secretaria Geral da Presidência, se comprometeu
a implementar o Conselho Nacional de Política Indigenista;
-
apoiaram a constituição do Conselho o Líder do PT no Senado, Senador Delcídio
Amaral, o Senador Eduardo Suplicy e o Deputado Eduardo Valverde, coordenador
da Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas, além do Presidente da
Funai Mércio Gomes.
2.
Terras Indígenas
-
manifestamos total apoio ao Governo Federal pela homologação da TI Raposa
Serra do Sol, em Roraima, em área contínua;
-
o tratamento vacilante da FUNAI e do Ministério da Justiça na garantia dos
direitos territoriais indígenas tem resultado em obstruções aos procedimentos
de regularização de terras indígenas e lentidão na constituição de GTs de
identificação, na publicação de resumos de relatórios e principalmente na
expedição de Portarias Declaratórias, caso das 14 terras paradas no Ministério
da Justiça cujo motivo da demora em declará-las não foi devidamente esclarecido
pelo Ministro da Justiça e muito menos pelo Presidente da Funai;
-
nos preocupamos com o tratamento dado à regularização de terras indígenas
nos Estados de Santa Catarina, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul onde pressões
políticas tem se sobreposto aos direitos indígenas;
- é
preocupante a falta de uma política decidida para resolver, de uma vez por
todas, os casos de ocupantes não-índios em Terras Indígenas já homologadas;
-
demonstramos preocupação quanto ao rumo que vem tomando o Poder Judiciário
quanto aos direitos territoriais indígenas, e esperança de que ele venha
a ser modificado para casos futuros, como é o da ação relativa à Terra Indígena
Caramuru-Paraguassu do povo Pataxó Hã-hã-hãe, que aguarda há mais de 20
anos uma solução;
-
exigimos a revogação da determinação do Presidente da Funai em não iniciar
os estudos para a revisão de limites de terras indígenas cujas demarcações
excluíram indevidamente partes do território tradicional;
-
o Ministro da Justiça se comprometeu a estudar caso-a-caso as 14
terras paradas no MJ, sem estabelecer prazos ou esclarecer os motivos da
demora, o que consideramos falta de compromisso objetivo;
-
o Presidente da Funai não se comprometeu em agilizar a regularização de
terras indígenas no que se relaciona à formação de GTs, publicação de resumos
de relatórios de identificação e tampouco prestou esclarecimentos quanto
à indevida negociação dos direitos territoriais indígenas;
-
o presidente do Incra assumiu o compromisso de realizar uma análise das
74 áreas de conflito envolvendo povos indígenas e pequenos agricultores,
com o objetivo de reassentar os pequenos agricultores fora dos territórios
indígenas.
3.
Ameaças aos direitos indígenas no Congresso Nacional
-
nos preocupamos com o grande volume de proposições legislativas que hoje
tramitam no Congresso Nacional contra os direitos indígenas assegurados
na Constituição Federal, especialmente os territoriais (destaques: PEC 38/99;
PEC 03/04; PLS 188/04);
-
entendemos que os direitos indígenas não devem ser tratados isoladamente,
mas de forma articulada dentro do Estatuto dos Povos Indígenas;
-
o Senador Delcídio, líder da Bancada de Apoio ao Governo no Senado
Federal, comprometeu-se em agir para que os direitos garantidos nos artigos
231 e 232 da Constituição Federal não sejam alterados pelo Congresso, bem
como reunir numa única comissão todas as proposições que estão tramitando
para preparar a discussão de reformulação do Estatuto dos Povos Indígenas;
-
o Senador Delcídio também comprometeu-se e garantiu que o PLS 188 não voltará
a tramitar no Congresso, a partir do entendimento de que é uma matéria tratada
isoladamente e contrária aos direitos indígenas.
-
o Ministro José Dirceu se comprometeu a orientar a base aliada para conter
as iniciativas legislativas que signifiquem retrocesso nos direitos indígenas.
4.
Gestão territorial e sustentabilidade das Terras Indígenas
-
constatamos uma dispersão dos recursos para gestão ambiental em Terras Indígenas
hoje existentes no Ministério do Meio Ambiente e dificuldade de acesso dos
povos e organizações indígenas a esses recursos;
-
entendemos ser necessário superar a lógica de projetos pontuais e de curto
prazo em favor de uma estratégia nacional concretizada em programas etno-regionais
de longo prazo, articulados com ações na área de educação;
-
estamos preocupados com a possível desvirtuação, no âmbito da Casa Civil,
do Ante Projeto de Lei de acesso a recursos genéticos e conhecimentos tradicionais
associados saído do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (Cgen) e elaborado
com participação das organizações indígenas e da sociedade civil organizada;
-
repudiamos o projeto de transposição do rio São Francisco e apoiamos um
programa de revitalização do rio;
-
propomos a criação de um programa nacional de gestão territorial e proteção
da biodiversidade em Terras Indígenas, com participação das organizações
indígenas em sua formulação e execução;
-
reivindicamos a participação indígena no Cgen com direito a voto;
-
o Ministério do Meio Ambiente assumiu o compromisso de finalizar
a formulação da pré-proposta do programa nacional de gestão territorial
e proteção da biodiversidade em Terras Indígenas até maio para encaminhar
para aprovação do Fundo Global do Meio Ambiente (GEF);
-
o Ministério do Meio Ambiente comprometeu-se em defender dentro do Executivo
a proposta de Anteprojeto de Lei de Acesso a Recursos Genéticos e Conhecimento
Tradicional apresentado pelo Cgen;
-
o Ministério do Meio Ambiente comprometeu-se em trabalhar em articulação
com as organizações indígenas na preparação e participação na 8a Reunião
das Partes da Convenção da Biodiversidade, a ser realizada no Brasil em
março de 2006;
-
O Ministério do Meio Ambiente comprometeu-se em reunir as várias ações para
os povos indígenas dentro do Ministério para integrá-las.
5-
Saúde Indígena
-
entendemos que o modelo de Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs)
deve ser assegurado, porém sua operacionalização encontra vários gargalos
tais como: falta de estrutura e capacitação para os indígenas que integram
os Conselhos Distritais; recursos incompatíveis com as suas demandas; falta
de autonomia administrativa e financeira dos DSEIs;
-
recusamos a tendência de municipalização da gestão da saúde indígena e exigimos
que a FUNASA se estruture para assumir de fato suas responsabilidades no
setor, garantindo sua federalização;
-
requeremos a participação indígena efetiva na construção e realização da
Conferência Nacional de Saúde Indígena;
-
reforçamos a necessidade de capacitação dos integrantes indígenas dos Conselhos
Locais e Distritais de Saúde Indígena para a fiscalização da aplicação dos
recursos e das ações da FUNASA;
-
exigimos que se garanta a autonomia administrativa e financeira dos DSEIs.
-
o Ministério da Saúde comprometeu-se em realizar a Conferência Nacional
de Saúde Indígena em Março de 2006, assegurando ampla participação dos povos
e organizações indígenas;
-
o Ministério da Saúde analisará e implementará regras próprias para as organizações
indígenas conveniadas com a FUNASA e com o reconhecimento profissional dos
agentes indígenas de saúde;
-
o Ministério da Saúde não se comprometeu com as demandas das plenárias quanto
a melhoria da eficiência da participação indígena nos Conselhos Locais e
Distritais e nem respondeu os questionamentos sobre a tendência à municipalização
da gestão.
6
– Educação
-
entendemos que a transferência da execução das ações da educação escolar
indígena para os estados – e destes para os municípios – é o principal problema
para a implantação de uma educação escolar indígena diferenciada e de qualidade;
-
os Estados e os municípios não são capazes ou demonstram vontade política
em seguir as orientações do MEC quanto a este tema;
-
exigimos do MEC a convocação de uma Conferência Nacional de Educação Indígena
e que o Governo Federal estude formas de exigir dos estados e municípios
o cumprimento da Constituição e das normais legais que nos asseguram uma
educação escolar diferenciada de qualidade;
-
exigimos a ampliação dos convênios com as Universidades Públicas Federais
e estaduais nas regiões e não só com a Universidade de Brasília;
-
exigimos do MEC que implemente junto aos Estados a abertura dos cursos de
ensino médio nas aldeias;
-
o Ministério da Educação - MEC não se comprometeu a convocar a Conferência
Nacional de Educação Indígena e nem tocou no assunto das escolas técnicas
e dos cursos de ensino médio nas aldeias;
-
o MEC se comprometeu a implementar o que chama de “assistência estudantil”
– uma bolsa de estudos para manter os estudantes indígenas nas universidades;
-
o MEC se comprometeu em pressionar os Estados para garantir a presença indígena
nos Conselhos Locais e Nacional do FUNDEF e em aumentar o orçamento para
a educação escolar indígena em 2006.
Ressaltamos
que o Acampamento Terra Livre é a expressão da vontade de união dos povos indígenas
do Brasil entre si e com seus aliados. Apesar das forças contrárias, continuamos
determinados a lutar para garantir o irrestrito respeito aos nossos direitos
assegurados na Constituição Federal de 1988 e na Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT).
Brasília,
29 de Abril de 2005.
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Coordenação Editorial:
Bruce Albert (Assessor Antropológico CCPY) e Luis Fernando Pereira (Jornalista CCPY)
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