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Notícias CCPY Urgente
Data: 23 - Janeiro - 2006
Titulo: Yanomami avaliam que exigência por mais recursos não garante qualidade no atendimento em saúde na Terra Indígena
Fonte:
CCPY – Comissão Pró-Yanomami, Boletim nº 75
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Yanomami
avaliam que exigência por mais recursos não garante qualidade no
atendimento em saúde na Terra Indígena
Dinheiro
não é a solução para os problemas que corroem o
atendimento à saúde indígena e afetam os trabalhos da Funasa
na Terra Indígena Yanomami. Esta foi a conclusão de Davi Kopenawa
Yanomami, Presidente da Hutukara Associação Yanomami, após
o término da última Conferência Distrital de Saúde
em Roraima, realizada entre os dias 10 e 12 de janeiro na Casa Paulo VI, em
Boa Vista (Roraima). Davi Kopenawa, um dos 12 representantes escolhidos entre
os cerca de 80 conselheiros yanomami presentes para participar da Conferência
Nacional de Saúde em Brasília no mês de março, declarou:
“Eu não quero pedir dinheiro para ninguém. Nós havíamos
pedido anteriormente porque o dinheiro estava demorando (ver
Boletim 68).
Isso melhorou apenas para eles, os funcionários [da Funasa]. Nós
não pretendemos pedir novamente dinheiro. Nós achamos que, apesar
do dinheiro, não ocorreram melhorias nas aldeias. A malária voltou
com força . Nas nossas comunidades não vimos a Funasa enviar equipamentos,
medicamentos, apesar de nós já os termos pedido (...) Nós
não queremos pedir dinheiro em Brasília, porque eu penso que é
mais dinheiro que podem roubar”.
Neutralização
da representação yanomami
Seguindo o modelo das Conferências Locais, foram propostos na Conferência
Distrital cinco temas de avaliação: direito à saúde;
controle social; desafios indígenas atuais; trabalhadores indígenas
e não-indígenas em saúde; bem como segurança alimentar,
nutricional e desenvolvimento sustentável. Estes temas deviam ser debatidos
e transformados em propostas, posteriormente encaminhadas para a Conferência
Nacional. Os temas foram precedidos por mesas redondas nas quais três
ou quatro participantes não-indígena discutiam sobre os assuntos
em pauta e um representante yanomami fazia a apresentação final.
Concluindo as discussões, uma reunião plenária foi dividida
em cinco grupos, sendo que cada um reapresentou o assunto contemplado anteriormente
e elaborou uma lista com cerca de 90 propostas que foram apresentadas e votadas.
Segundo Ednelson Pereira, coordenador do programa agroflorestal da CCPY, que
também participou da conferência, tal estrutura de trabalho altamente
burocratizada e etnocêntrica é improdutiva por não contemplar
espaços culturalmente apropriados para permitir manifestações
efetiva dos Yanomami, assim: “Nas conferências locais nunca se passou
da discussão do primeiro tema, em geral porque a situação
caótica no atendimento e o pouco tempo destinado às conferências
deixavam os Yanomami mais preocupados em avaliar o atendimento do que outra
coisa”.
Municipalização
da saúde indígena
Uma das preocupações principais dos Conselheiros yanomami, além
da degradação do atendimento, foi voltada em direção
à rumores insistentes sobre projetos de municipalização
do atendimento da saúde indígena, como o evidencia a fala de Davi
Kopenawa durante a Conferência:“Nós estamos preocupados com
outras palavras. O governo federal pode querer acabar com o Distrito Sanitário
Especial Yanomami (DSEY). Se acabar, vai dividir os recursos entre os municípios,
talvez para o governo estadual também. Estou muito preocupado com essas
notícias, porque o atendimento assim dividido só vai piorar ainda.
Foi assim que alguns da Funasa nos disseram: ‘Vocês devem ficar
atentos. Assim que o governo acabar com o DSEY vai dividir os recursos para
os municípios. A Funasa não está melhorando, está
tendo muita confusão, por isso o governo quer passar para os municípios’.
É isso que pretendo também dizer em Brasília. Vocês
não podem passar o atendimento para os municípios, tem que melhorar
a Funasa. Se vocês fizerem isso, as coisas não vão melhorar,
o dinheiro vai se perder mais, ninguém ficará atento”.
Escolha
dos delegados
O momento mais relevante do evento, segundo Davi Kopenawa, foi o da escolha
dos 12 representantes yanomami, já que nenhuma das reivindicações
feitas em reuniões e manifestações recentes (ver
Boletins Pró-Yanomami 71,
72
e 73
e Comunicados de 15/09
e 24/11/2005)
teve uma resposta concreta: “Acho que foi importante a discussão
para escolhermos os delegados que irão para Brasília. Agora, sobre
melhorar os trabalhos da Funasa, nenhuma palavra ‘forte’ foi falada.
Eu não acredito mais em palavras assim, porque nós, Yanomami,
estamos vigilantes. Há poucos que querem melhorar as coisas mas, políticos
de Roraima e políticos de Brasília não deixam, há
aqueles que proíbem melhorar. ‘Não façam coisas boas
na floresta yanomami’, é o que alguns dizem quando discutem”.
Além de Davi, seguirão para Brasília os representantes
indígenas Mateus (Auaris), Castro (Ye´kuana), Paraná (Surucucu),
Eliseu (Alto Mucajaí), Alexandre (Missão Catrimani), Abraão
(Novo Demini) e Francisco Xavier (Maturacá), entre outros, e 12 delegados
representando organizações e instituições que trabalham
com a saúde yanomami, como a Diocese de Roraima, o Instituto Brasileiro
de Direito à Saúde (IBDS), a Fundação Universidade
de Brasília (FUB), o Serviço de Cooperação do Povo
Yanomami (Secoya), as Missões Evangélicas da Amazônia (MEVA)
e as Missões Novas Tribos do Brasil (MNTB).
Ausência
e desinteresse da Direção da Funasa
Davi Kopenawa expressou também insatisfação com a ausência
e a falta de interesse da direção da Funasa com a questão
yanomami: “Nós havíamos chamado pelo pessoal de Brasília,
pelo presidente da Funasa, mas ele não compareceu. O coordenador regional
da Funasa também não se sentou nesta reunião, não
falaram conosco, não discutiram. Nós, Yanomami, sozinhos é
que discutimos entre nós, alguns da Funasa daqui nos ajudaram, mas não
eram chefes grandes, apenas funcionários que não podem decidir
nada. ‘O que faremos? Vamos tentar melhorar as palavras sobre a Conferência
Nacional de Saúde, não há lideranças aqui, mas vamos
nos esforçar em tentar melhorar’, foi assim que discutimos. Só
nós, os ‘pequenos’, fizemos a reunião, já que
os ‘grandes’ de Brasília não participaram”.
Após grande expectativa dos Yanomami, que aguardavam a presença
de autoridades da Funasa de Brasília, o último dia de conferência
contou apenas com a presença do Coordenador do Projeto VIGISUS, que foi
longamente sabatinado pelos conselheiros, especialmente por Davi Kopenawa, que
relata: “Nós queremos apenas um atendimento de saúde muito
bom, mas ele não melhora, ainda é fraco. O chefe do VIGISUS, que
enviou aviões para nos buscar em nossas comunidades, falou que vai trabalhar
muito, que vai melhorar, vai comprar motores, barcos, materiais, equipamento
de saúde, geladeiras e laboratórios e arrumar os postos. Ele disso
isso, mas eu não penso que essas palavras possam ser totalmente verdadeiras.
Eu já estou acostumado com promessas, os Brancos costumam fazer muitas
promessas. É bom e correto que ele fale isso, mas ao mesmo tempo não
é bom dizer coisas à toa, por isso estou triste”.
Rejeição
do Coordenador atual da Funasa de Roraima
Os Conselheiros indígenas também reforçaram sua rejeição
ao nome do Coordenador regional da Funasa em Boa Vista. “Nós falamos
ao chefe do VIGISUS, quando ele estava com os ouvidos atentos, sobre o coordenador
regional: ‘Esta pessoa quando já foi coordenadora da Funasa de
Roraima trabalhou somente no início mas não bem e nem suficiente.
Começou a reforma na Casa do Índio mas acabou rapidamente com
os recursos e não melhorou o atendimento. Pedimos por remédios
e equipamentos, mas nunca apareceram. Ele deixou que vacinas estragassem, pois
não havia geladeiras’. Outros também falaram que não
queriam ele, assim o pessoal do Conselho Indígena de Roraima (CIR) falou
também que não o queria mais”, declarou Davi Kopenawa.
Ednelson Pereira, representante da CCPY, ressaltou que apesar deste momento
dos debates no qual os conselheiros yanomami expuseram com maior veemência
as suas insatisfações em relação ao atendimento
de saúde, suas manifestações foram interrompidas pelos
organizadores: “Os Yanomami pediram a palavra e daí foi uma seqüência
de falas questionando o mal atendimento prestado e o aumento assustador da malária
na terra yanomami, a falência da política de saúde indígena
do governo Lula e, sobretudo, a permanência do atual coordenador regional
da Funasa (...)porém houve manobra do intérprete da Funasa para
desmotivar os Yanomami a continuarem a sabatina do responsável do VIGISUS”.
Desarticulação
da participação das ONGs
Segundo Ednelson Pereira houve ainda na Conferência Distrital um nítido
esforço em desarticular a participação de representantes
de organizações não-governamentais, como a CCPY. Após
se ver mobilizado constantemente durante toda a conferência como palestrante,
coordenador de mesa, relator e coordenador de grupo, Ednelson Pereira foi informado
no final do evento que sua participação na Conferência Nacional
e, por extensão, da instituição que representava, não
era da responsabilidade da Funasa. “O último ato dos debates veio
acompanhada de uma manobra para excluir os aliados dos Yanomami fora da Conferência
Nacional: na hora da escolha dos delegados, isso já tarde na noite, foi
anunciado por uma enviada de Brasília que os delegados das ONGs que eventualmente
fossem escolhidos na Conferência Distrital deveriam, ao contrario dos
outros participantes, arcar com suas despesas se queriam participar da Conferência
nacional pois a Funasa somente se responsabilizaria com as despesas de delegados
das instituições governamentais, o que criou um clima de surpresa
e indignação entre os representantes institucionais não-governamentais”.
Promessas
vazias e questões não respondidas
Ainda
de acordo com Davi Kopenawa, o fechamento da Conferência Distrital não
se realizou a contento e foi principalmente marcado por promessas vazias e uma
certa confusão que não permitiu o esclarecimento de muitas dúvidas:
“Nós não queríamos assustar ninguém, nós
falamos forte e corretamente por isso acho que o chefe do VIGISUS ficou com
um pouco de medo. ‘Você, chefe da Funasa, deve nos escutar, também
deve explicar e nos ajudar.
Vocês devem agir de maneira firme, vocês devem pensar em realmente
melhorar as coisas. Se vocês mantiverem firme em suas mãos a Conferência
Nacional de Saúde então nós nos alegraremos. Não
falem mais mentiras. Se falarem a verdade, ficaremos contentes’, foi assim
que falamos. Ele respondeu: ‘Vamos melhorar o atendimento, a forma como
nós curamos os Yanomami e como trabalhamos. Eu não penso em enganá-los,
se eu já conhecesse vocês, vocês poderiam pensar que eu queria
enganá-los, mas não é o caso’.
Nós conversávamos assim, mas todos falaram ao mesmo tempo e ele
acabou não respondendo. Outros queriam falar firme também e, mas
ele fugiu e não respondeu às perguntas pelas quais nós
o chamamos”.
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Coordenação Editorial: Bruce Albert (Assessor Antropológico CCPY) e Luis Fernando Pereira (Jornalista CCPY)
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