Lideranças Yanomami das comunidades Maturacá,
Nazaré, Inambu e Maia, no Amazonas, representadas pela AYRCA (Associação Yanomami
do Rio Cauburis e afluentes), divulgaram carta aberta no primeiro dia da V Assembléia
Geral da FOIRN (Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro), se posicionando
contra a construção de um ramal rodoviário que o Exército planeja construir
ligando o km 115 da BR-307 (São Gabriel da Cachoeira-Cucuí) até a aldeia Maturacá,
junto da qual está instalado um pelotão de fronteira.
Cópias da carta foram entregues em mãos
ao presidente da FUNAI, Glenio Álvares, e aos comandantes do Exército na região,
Ten. Cel. Madeira (V BIS) e Mj. Ebling (I CIA do I BEC).
Os 25 Yanomami
que assinaram a carta alegam que a estrada traria transtornos e não benefícios,
pois facilitaria a invasão de estranhos, sobretudo garimpeiros e turistas,
com impactos culturais e sanitários negativos, além de prejudicar os locais
de caça e pesca. “A FUNAI não conseguiria vigiar a estrada, assim como não
consegue vigiar os rios e conseqüentemente a presença de estranhos e de cachaça,
com certeza, aumentaria”, diz o documento. Além do mais, os signatários da
carta perguntam: quem manteria a nova estrada, uma vez que a BR-307 “está
praticamente abandonada”?
De fato, questionamentos
sobre o custo-benefício dessas estradas merecem atenção. Os 204 km da BR-307,
que consumiram dez anos de trabalho do Batalhão de Engenharia e Construção
(1972/82), custam 800 mil reais por ano de manutenção e ficam parcialmente
intransitáveis durante o “inverno” (período das chuvas), entre abril e outubro.
O ramal planejado
para Maturacá custaria onze milhões de reais, levaria dez anos para ser concluído
e consumiria mais 500 mil reais/ano de manutenção, segundo estimativas.
A hora da decisão
sobre a estrada pode estar próxima. O comandante da I CIA do I BEC, de S.
Gabriel da Cachoeira, Major Ebling, que recebeu cópia da carta dos Yanomami
na Assembléia da FOIRN, afirmou que a estrada ainda é uma “possibilidade em
estudo” e que nada será executado sem o consentimento da comunidade Yanomami
de Maturacá.
Nos últimos meses,
um conjunto de técnicos, incluindo um antropólogo e uma geógrafa da Universidade
do Amazonas, está realizando um estudo de impacto ambiental (EIA-RIMA) do
projeto da estrada, a pedido do IME (Instituto Militar de Engenharia), cujos
resultados devem ser submetidos a uma audiência pública ainda este ano.
Para convencer
os Yanomami das vantagens da estrada, o Exército tem oferecido uma série de
benefícios, na forma de obras de infra-estrutura e serviços como poços artesianos,
pontes ligando comunidades, veículos utilitários, assistência médica, entre
outros. Com os recursos crescentes do Calha Norte, projeto reforçado com a
“crise colombiana”, pode-se supor que o Exército terá cacife para cumprir
as promessas.
Na carta, os Yanomami
dizem que estão interessados nos benefícios do governo, mas desde que não venham
em troca da estrada.
(ISA - S.Gabriel
da Cachoeira, com base na Carta Aberta dos Yanomami das Comunidades de Maturacá,
Nazaré, Inambu e Maio, 24/10/00)