.

MASSACRE / HAXIMU

 
 


... Geral | Conflitos | Educação Intercultural | Meio Ambiente | Saúde Yanomami

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


MASSACRE DE HAXIMU

.
TRF anula julgamento do massacre de HAXIMU !!
STJ vai examinar o caso no início de Setembro.

Esta seção do Yanomami Online, é especialmente dedicada ao Massacre de Haximú, ocorrido em junho de 1993, durante dois ataques quando 16 yanomami foram mortos barbaramente. Segundo os autos do processo, foram mortos cinco homens, três mulheres, três moças adolescentes, quatro crianças e um bebê. Dos 22 garimpeiros participantes da chacina apenas 5 foram condenados no julgamento proferido em Boa Vista (RR), pelo juiz federal Itagiba Catta Preta Neto, em 19.12.96. A sentença de primeira instância impôs aos criminosos penas que variaram entre 20 e 19 anos de reclusão, para o crime de genocídio, e à 6 meses de detenção, para o crime de danos. Os genocidas ainda escaparam de ser penalizados pelo crime de ocultação de cadáver, por falta de provas.

Mas, por que voltar à esse triste assunto, sete anos depois? Porque o julgamento de primeira instância foi questionado na Justiça Federal pelos assassinos condenados, sob o argumento de que quando se trata de crime de morte, este deve ser julgado por um tribunal de júri, o que, infelizmente, foi aceito pelo Tribunal Regional Federal-1ª Região, significando a anulação do julgamento feito pelo juiz federal de Boa Vista. Outra consequência da referida anulação poderá ser a realização de novo julgamento, por um júri popular em Roraima. Conheça os detalhes desta situação absurda nesta edição especial.

A apelação dos garimpeiros assassinos foi aceita pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, mas a procuradoria da República-PR entrou com recurso especial contra o acórdão do TRF, solicitando que o Superior Tribunal de Justiça - STJ reconheça a competência do juiz de primeira instância para apreciar e julgar o caso. "O Ministério Público Federal compreende que, sendo competente a Justiça Federal, a competência é do juiz singular e não do Tribunal do Júri popular. Isto porque, no genocídio, o bem jurídico tutelado não é a vida, mas a etnia". como está escrito nos autos. Se o STJ confirmar a decisão do TRF-1ª Região, além do erro jurídico significará a certeza da impunidade, já que em Boa Vista(RR) os tribunais de júri geralmente são compostos por jurados, que sempre estão contra os índios e a favor de seus agressores. O recurso especial será examinado na primeira semana de agosto próximo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), 5ª Turma. Existem duas possibilidades para a solução imediata do caso: ou o STJ restaura a validade do julgamento de primeira instância e, portanto, simplesmente cassa a decisão do TRF; ou determina um novo julgamento da apelação dos assassinos ao TRF.

Será um grande retrocesso se os assassinos vierem a conseguir a anulação do julgamento e de suas penas. A Justiça brasileira não pode cometer essa injustiça.     

.

Genocídio – No começo, boatos e mentiras

No início de agosto de 93, iniciaram-se os boatos sobre o massacre. A data exata do crime não foi definida devido a distância e a dificuldade de acesso entre a região do Haximu e o posto da CCPY mais próximo, o Toototobi. A primeira notícia concreta foi um bilhete de uma freira da região do Xitei (pronuncia-se "xidéia"), que chegou ao posto do Demini, datado de 17.08.93. Nele, a Irmã Aléssia dizia que o tuxawa Antônio falara sobre a morte de sete crianças, cinco mulheres e dois homens, e da destruição da maloca. Entre as várias observações de Antônio, a freira citava que a maloca destruída era de pouco contato com os "brancos". Do Xitei ao Haximu são dois dias de caminhada. Irmã Aléssia também solicitava a presença da Funai para investigar o caso.

No dia 18.08.93, o Massacre de Haximu virou manchete nos jornais. A cobertura jornalística e a corrida dos profissionais de imprensa à Roraima foi iniciada, acompanhada de muita confusão. A maioria das matérias e reportagens veiculada pelos jornais e tv’s estava baseada em fatos e informações sem comprovação e distorciam o fato ocorrido, principalmente em relação ao número de vítimas. Nessa ocasião, os locais do crime nem sequer haviam sido submetidos a uma investigação mais adequada. Funcionários da Funai, pressionados pela mídia e pelo governo, davam depoimentos irresponsáveis e completamente descabidos de veracidade, a partir de boatos e comentários. A mídia nacional e estrangeira chegou a divulgar que o total de mortos teria sido de mais de uma centena de Yanomami.

Davi Kopenawa e vários Yanomami foram ao local do crime de helicóptero, acompanhados pelo então ministro da Justiça, Maurício Correia, pelo procurador geral da República, Aristides Junqueira, pelo presidente da Funai na época, Cláudio Romero, funcionários da Funai e jornalistas. No local encontraram duas malocas queimadas, restos de fogueira - onde os corpos haviam sido cremados -, e um corpo de mulher crivado de balas, com a cabeça partida a golpes de facão. Posteriormente, encontraram o lugar exato da chacina, onde acharam pedaços de dentes humanos e resquícios de ossos e cinzas. Os vestígios indicavam que os sobreviventes saíram apressadamente daquele local.

Em 25.08.93, a CCPY noticiou que 69 sobreviventes haviam chegado ao posto de atendimento no Toototobi, entre eles quatro feridos com marcas de chumbo, sendo duas meninas (de sete e seis anos) e dois homens (de vinte e dezoito anos).

.

O relato dos sobreviventes

Os sobreviventes relataram que os garimpeiros atacaram os índios pela primeira vez, em meados de junho, quando quatro homens adultos foram mortos à bala. Algum tempo depois, disseram que vingaram-se, matando dois garimpeiros. Por volta dos dias 22 e 23 de julho, perto do meio-dia, os garimpeiros cercaram os três lados de uma maloca indígena próxima a uma roça abandonada, onde um grupo de Yanomami ali acampado havia saído para buscar pupunha na parte baixa do rio Hwaximeu.

O grupo foi surpreendido pelos garimpeiros armados de facão, espingardas e revólveres. Só havia um homem adulto no grupo constituído por crianças e mulheres. Os adultos foram mortos a tiros e mutilados com facão. As crianças foram mortas a golpes de facão na cabeça e no peito. Uma mulher idosa foi morta a pontapés. Os sobreviventes disseram que cremaram 11 corpos, e que o corpo de uma mulher não foi cremado, por não ter no local um parente que lhe chorasse a morte. É um hábito Yanomami cremar seus mortos. Os índios citaram os nomes dos garimperios brasileiros conhecidos pelos seguintes apelidos : Boca Rica, Chico Ceará, Paraná, Piauí, Cantina, João Neto, Goiano, Gaúcho, Elias, Jabuti, Rocha, Baiano, Manéu, Chaparral, Picão, Uiuiui, João Cururu, Zeca, Geni, Paulista e Paulo.

Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos. Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos. Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos. Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos. Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos. Os sobreviventes estão segurando cestas com pequenas cuias, contendo as cinzas dos restos terrestres  dos corpos cremados dos parentes assassinados. É um ritual ancestral dos Yanomami cremar seus corpos.
.......................................Sobrevivetes do Massacre de Haximu - foto: Carlo Zacquini
........................................................(corra o mouse pela foto para ler mais detalhes)

De acordo com o inquérito policial – conduzido pelo delegado da Polícia Federal Raimundo Cotrin, que serviu de base para a denúncia do Ministério Público - o crime de genocídio aconteceu em duas etapas : na primeira, quatro homens foram mortos a tiro, num local dentro da floresta e distante da aldeia, sendo que um corpo não foi encontrado; na segunda, algumas semanas depois, doze pessoas foram mortas a tiros e mutiladas com facão – sendo um homem adulto, duas idosas, uma mulher, três adolescentes, quatro crianças e um bebê. Este segundo grupo já estava fora da aldeia, nos tapiris, o que indicava que estava escondido dentro da mata, temendo novo ataque dos garimpeiros, depois das primeiras quatro mortes.

.

Nomes dos juizes e procuradores
responsáveis pelo caso do
Massacre de Haximu

  • Juiz federal de Boa Vista(RR), de primeira instância: Itagiba Catta Preta Neto;

  • Procuradores da República, autores da denúncia e recursos: Luciano Mariz Maia, Franklin Rodrigues da Costa e Carlos Frederico Santos;

  • Juízes da Terceira Turma do TRF-1ª Região, que anularam o julgamento de Boa Vista: Olindo Menezes, Eustáquio Silveira, Cândido Ribeiro e Antônio Ezequiel;

  • Presidente do TRF-1ª Região: Fernando da Costa Tourinho Neto;

  • Ministros do STJ-5ª Turma, que julgarão o caso: Jorge Tadeo Flaquer Scartezzini, José Arnaldo da Fonseca, Gilson Langaro Dipp, Edson de Carvalho Vidigal, Félix Fischer.

.

Nomes dos garimpeiros condenados
e suas penas

  • Pedro Emiliano Garcia, vulgo "Pedro Prancheta", à 20 anos de reclusão, pelo crime de genocídio, e à 6 meses de detenção pelo crime de dano qualificado;

  • Eliézio Monteiro Neri, vulgo Eliézer, à 19 anos e 6 meses de reclusão, pelo crime de genocídio, e à 6 meses de detenção, pelo crime de dano qualificado;

  • Francisco Alves Rodrigues, vulgo "Chico Ceará", à 19 anos e 6 meses de reclusão pelo crime de genocídio, e à 6 meses de detenção, pelo crime de dano qualificado;

  • João Pereira de Morais, vulgo "João Neto", à 19 anos e 6 meses de reclusão, pelo crime de genocídio, e à 6 meses de detenção, pelo crime de dano qualificado;

  • Juvenal Silva, vulgo "Curupira", à 19 anos e 6 meses de reclusão, pelo crime de genocídio, e à 6 meses de detenção, pelo crime de dano qualificado;

.

 

Depoimentos de microscopistas e professores yanomami, reunidos em Boa Vista para curso de Português, aos Exmos. Srs. Ministros do STJ - 5a Turma, dia 10 de julho de 2000

"Nós yanomami não queremos estes homens, não podemos deixá-los sair da prisão. Nós yanomami lembramos ainda destes homens. Genocídio! Por isso, nós yanomami mandamos essa carta. Olha, não podem tirar estes homens da prisão, o melhor é deixá-los presos. Agora, nós yanomami estamos sabendo do que aconteceu, por isso mandamos essa carta para vocês. Nós somos microscopistas yanomami. Nós somos professores yanomami. Recebam essa nossa carta. Se estes homens continuarem presos, nós yanomami acharemos justo. Nós agradecemos muito sua compreensão."

Joseca Yanomami - microscopísta
Geraldo Yanomami - microscopísta
Joãozinho Yanomami - professor
Kení Yanomami - professor
Alípío Yanomami - professor
Turío Yanomami - professor
Hugo Yanomami - professor
Dárío Yanomami - professor
Lourenço Yanomami - professor
Sanimão Yanomami - professor

.

Depoimentos

Claudia Andujar, fundadora e coordenadora da CCPY: "A única explicação de aceitar a apelação dos garimpeiros pela Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1º Região é de querer legitimar a contínua invasão, enquanto existir ouro nos leitos do rios da terra Yanomami, e índios no caminho dos invasores. Não vejo covardia maior da parte do TRF do que acatar a apelação dos garimpeiros e entregar os Yanomami nas mão dos seus assassinos. Se a anulação do julgamento for confirmada pelo STJ, o século 21 começará como sendo um novo século de crimes bárbaros contra os índios".

Carlo Zacquini, fundador e diretor da CCPY: "Na realidade os Yanomami não estão sabendo do questionamento sobre o julgamento dos condenados pelo Massacre de Haximu. Eles ficaram muito chocados, na ocasião, com o crime ocorrido e carregarão esse trauma por muitas gerações. A desconfiança deles em relação aos brancos é muito grande. Eles achavam que crianças e mulheres seriam poupados pelos brancos. Fico perplexo e triste hoje, no ano 2000, com a anulação do julgamento, pois os depoimentos e inquérito foram muito bem fundamentados".

.

Juiz Scartezzini, do STJ-5ª Turma, Retorna de Licença Médica em 10/09/2000

A solução do Massacre do Haximu poderá ocorrer a partir do dia 10 de setembro, quando estará retornando ao trabalho o juiz Jorge Flaquer Scartezzini, do Superior Tribunal de Justiça, 5ª Turma, responsável pelo caso. Ele deverá dar a palavra final sobre o recurso especial dos procuradores da República e resolver se o STJ acata ou não a anulação do julgamento feito pelo juiz federal de Boa Vista, Itagiba Catta Preta, aceito pelo TRF-1ª Região, a pedido dos criminosos. Segundo os procuradores, trata-se de um erro jurídico cometido pelo TRF-1ª Região, pois o massacre foi tipicamente um caso de genocídio e não de homicídio, como argumentam os assassinos para conseguir um julgamento de júri popular em Roraima. A CCPY, amigos e simpatizantes dos Yanomami e da causa indígena esperam que o juiz-relator do caso Haximu decida pela restauração do julgamento realizado pelo juiz federal de Boa Vista, mantendo os dois garimpeiros genocidas presos.

.

STJ considera massacre Yanomami em
Haximu crime de genocídio.

Decisão reforma sentença do TRF de Brasília e mantém a competência da Justiça Federal de Roraima para julgar o caso -
21/09/2000

Pela primeira vez na história dos tribunais brasileiros, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) , reconheceu a ocorrência de crime de genocídio pelas mortes decorrentes do conflito entre Yanomamis e garimpeiros que resultou na morte de 16 índios, e praticamente no extermínio da aldeia Haximu, em agosto de 1993. A decisão, proferida no último dia 12 de setembro, foi unânime e constitui um verdadeiro marco histórico na jurisprudência indigenista e criminal no Brasil. Assim, o STJ confirmou a sentença condenatória do juiz federal de Roraima, garantindo a condenação dos garimpeiros responsáveis pelo crime de genocídio.

A decisão do STJ reforma decisão anterior do Tribunal Regional Federal da 1 ª Região, que havia anulado a sentença condenatória de primeiro grau sob o argumento de que se tratava de um crime doloso contra a vida, sendo portanto de competência do tribunal do júri. O STJ, por sua vez, entendeu que o crime de genocídio, no caso Haximu, constitui um crime contra a etnia indígena Yanomami, e não propriamente um crime doloso contra a vida, razão pela qual afastou a competência do tribunal do júri e manteve a competência do juiz singular, validando portanto a sentença condenatória de primeiro grau.

IMPORTANTE PRECEDENTE

De acordo com o Procurador Regional da República Luciano Mariz Maia, autor do recurso do Ministério Público junto ao STJ, trata-se de um importante precedente, uma vez que a decisão garante "que os crimes cometidos contra os índios não fiquem impunes, já que o tribunal do júri é formado por homens e mulheres da sociedade envolvente, majoritária, a qual ordinariamente absorve o preconceito e a discriminação contrários à justiça, e absolve garimpeiros, fazendeiros, madeireiros e outros integrantes de grupos econômicos e sociais, que avançam contra os bens e as pessoas de índios e suas comunidades".

O extermínio dos Yanomamis ocorreu em um contexto de conflitos entre a comunidade e a presença dos garimpeiros na região, e refletem sentimentos de retribuição e vingança com agressividade contra um grupo étnico, características do genocídio. Como bem afirmou o Procurador Regional da República Franklin Rodrigues da Costa, que também assina o recurso ajuizado no STJ, nesse caso, como em todos os casos de genocídio, "o bem jurídico tutelado não é a vida, mas sim a etnia". Ao contrário dos crimes dolosos contra a vida, o genocídio tem um caráter de impessoalidade, atingindo toda uma comunidade ou parte dela, ou mesmo um indivíduo, mas tão-somente devido aos mesmos pertencerem ao grupo étnico que se visa atingir.

O genocídio dos Yanomamis foi inicialmente julgado pela Justiça Federal de Roraima, em 19 de Dezembro de 1996. O juiz Itagiba Catta Preta reconheceu o genocídio como delito distinto do homicídio, impondo pena de 19 anos e 6 meses aos garimpeiros Juvenal Silva (Cururupu), Francisco Alves Rodrigues (Chico Ceará), João Pereira de Morais (João Neto) e Elézio Monteiro Néri (Eliézer); e pena de 20 anos e 6 meses a Pedro Emiliano Garcia (Pedro Pancheta). Dessa sentença houve recurso ao Tribunal Regional Federal por parte dos condenados, que decidiu, por maioria, anular a sentença proferida na justiça federal de Roraima, reconhecendo o homicídio, mas determinando que a competência seria do tribunal do júri.

A decisão do STJ, decorrente de apelação feita contra a decisão dada pelo TRF da 1ª Região, restaurou a sentença condenatória do juiz de Roraima. Ficou assim determinada, com a decisão do órgão, a diferenciação entre o homicídio, enquanto crime doloso contra a vida e o genocídio, enquanto crime contra uma determinada etnia. Essa diferenciação é importante na medida em que, sendo o genocídio considerado crime contra a Humanidade, conforme tratado internacional do qual o Brasil é signatário, não pode ser julgado por leigos, ou seja, pelo Tribunal do Júri, que é composto por pessoas de formação não jurídica.

A decisão do STJ resolve o conflito de competência garantindo a validade da decisão proferida pela justiça federal de Roraima. Porém, o TRF da 1ª Região ainda deve se manifestar a respeito do mérito da questão, decidindo sobre a extensão da responsabilidade criminal de cada um dos condenados.

Lilia Toledo Diniz e Fernando Baptista (ISA-SP, 21/9/00)
Marco Gonçalves
Programa Brasil Socioambiental
Instituto Socioambiental
marco@socioambiental.org

.

STJ sustenta ocorrência de genocídio no caso do Massacre de Haximu

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça-STJ decidiu por unanimidade, na sua sessão plenária do dia 12 de setembro, que o massacre de 16 Yanomami por um grupo de garimpeiros brasileiros ocorrido em 1993, conhecido como o Massacre do Haximu, se constituiu em crime de genocídio e que, portanto, sendo um crime contra a Humanidade, não pode ser julgado por leigos. Mantém-se, assim, a posição original do STF ,sustentada pelo Ministério Público, de que não se trata de um caso para ser submetido a júri popular. Como afirmou o Procurador Regional da República, Franklin Rodrigues da Costa, que assinou o recurso ajuizado no STJ, neste caso, como em todos os casos de genocídio, "o bem jurírico tutelado não é a vida, mas sim a etnia".

Essa decisão do STJ representa um marco histórico na jurisprudência brasileira, pois é a primeira vez que uma alta corte sustenta a occorrência de genocídio no país. Nas palavras de Luciano Mariz Maia, Procurador da Sexta Câmara da Procuradoria Regional da República , " a decisão do STJ constituiu um fato importante para a Justiça brasileira, pois outros casos de mortes coletivas de etnias poderão ser denunciados como genocídio, a partir de ontem". Luciano Mariz Maia é um dos autores da apelação criminal do Ministério Público cuja lucidez de argumentação foi decisiva para o voto unânime dos ministros do STJ. Daqui em diante, as apelações da defesa dos garimpeiros serão julgadas pelo TRF.

É preciso ressaltar que a defesa dos direitos yanomami neste caso contou e continuará contando com a valiosíssima contribuição do Dr. Aristides Junqueira que na época do massacre, na condição de Procurador Geral da República, ao constatar in loco as evidências do crime, qualificou-o como um claro caso de genocídio.

Esta decisão judicial representa uma vitória não apenas para os Yanomami, mas para todo e qualquer grupo minoritário que venha a enfrentar situação semelhante.

Neste sentido, a CCPY manifesta seu júbilo não apenas pela decisão do STJ, mas também pelo fato de os Yanomami representarem um caso exemplar para a jurisprudência relativa aos direitos das minorias.

.

Ex-procurador Geral da República vai defender povo YANOMAMI junto ao TRF

O ex-Procurador Geral da República, Dr. Aristídes Junqueira, defenderá o interesse do povo Yanomami junto ao TRF-1ª Região, que deverá reexaminar o caso. O STJ-5ª Turma decidiu, no início de setembro, que o Massacre de Haximu se configura como um caso de genocídio e como tal cabe à Justiça Federal julgá-lo, não sendo aceita a argumentação da defesa dos réus segundo a qual o caso deveria ser julgado por um tribunal de júri. Esta decisão, primeira no país, criou jurisprudência para casos de genocídio. As outras apelações da defesa dos genocídas, a serem julgadas pelo TRF, tratam da redução de suas penas.

O Dr. Aristídes Junqueira esteve na região logo depois do massacre, quando ocupava o cargo de Procurador Geral da República, e aceitou a solicitação da CCPY para defender o interesse do povo Yanomami neste caso. Num gesto altamente louvável, o Dr. Junqueira prestará esse serviço aos Yanomami sem cobrar honorários.

.

STJ rejeita recurso dos condenados pelo Massacre de Haximui

Decisão, proferida no final do último mês de maio, reafirma sentença da Justiça Federal de Roraima, que em 1996 condenou cinco garimpeiros por crime de genocídio

A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília, rejeitou por unanimidade recurso para rever a condenação de cinco garimpeiros pelo crime de genocídio cometido contra o povo yanomami em agosto de 1993, episódio que ficou conhecido como "Massacre do Haximu". O recurso foi a mais recente tentativa dos garimpeiros para anular a decisão do juiz federal de Roraima, Itagiba Catta Preta Neto que, em 19 de dezembro de 1996, os condenou a penas que variam de 19 anos e seis meses a 20 anos e seis meses de reclusão por crime de genocídio.

Em junho de 1998, os garimpeiros conseguiram reverter a decisão com a anulação da sentença por parte do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. Em sua decisão, o TRF alegou que, apesar de reconhecer tratar-se de genocídio, se tratava também de crime doloso contra a vida, por isso, cabendo o julgamento ao tribunal do júri. O Ministério Público Federal, no entanto, recorreu da decisão ao STJ que, sob a relatoria do ministro Jorge Scartezzini, acolheu o recurso e restabeleceu a condenação, sob o fundamento de que, embora se trate de homicídios dolosos, estes constituem crime de genocídio, passíveis, portanto, de julgamento por juiz singular.

Diante da segunda decisão desfavorável, os garimpeiros entraram com embargos, desta vez, alegando que, ao analisar o pedido do Ministério Público Federal, a 5ª Turma do STJ não teria se manifestado sobre questões constitucionais referentes ao julgamento do crime de genocídio. Entretanto, o ministro Jorge Scartezzini, relator do novo recurso, rejeitou o pedido dos garimpeiros afirmando que a decisão anterior "teria abordado por completo o tema". Ainda segundo o relator, o recurso adequado para esse tipo de questão é o extraordinário, a ser apresentado ao Supremo Tribunal Federal.

Dezesseis mortes

Denunciado à Funai em agosto de 1993 pelos próprios Yanomami, o Massacre do Haximu foi mais um dos muitos nefastos episódios decorrentes da invasão da terra indígena por garimpeiros. À época do massacre, estimava-se que aquela escaramuça dos invasores tivesse eliminado cerca de 70 índios, ou seja, praticamente todos os habitantes de duas malocas no Haximu, localizadas próximo à fronteira, na Venezuela.

Após semanas de informações desencontradas e grande comoção nacional e internacional, um levantamento feito pelo antropólogo Bruce Albert, da Comissão Pró-Yanomami, constatou tratar-se de 16 Yanonami, majoritariamente mulheres, velhos e crianças, mortos a tiros e golpes de terçados (facões). O número de mortes só não foi maior porque grande parte da população do Haximu estava concentrada em outra maloca para a realização de rituais.

Segundo relatos recolhidos pelo antropólogo, a ação foi planejada por empresários de garimpo conhecidos em Roraima que, após o massacre, evadiram-se da área. Baseado em detalhados relatos dos sobreviventes, Albert estimou que 14 garimpeiros protagonizaram a chacina. Entretanto, apenas a metade pôde ser identificada pelos apelidos e codinomes e cinco foram condenados. Com a mais recente decisão do STJ, eles continuarão presos por crime de genocídio.

Comitê Editorial: Alcida Rita Ramos, Bruce Albert, Jô Cardoso de Oliveira
Redação: Marco Antonio Gonçalves
Distribuição e secretaria: Mariana Valente
Web Site: Claudia Andujar


Para informações adicionais favor enviar e-mail para o escritório central da CCPY no seguinte endereço:

ccpydf@uol.com.br



... Geral | Conflitos | Educação Intercultural | Meio Ambiente | Saúde Yanomami .