O sobrevôo não-autorizado de um helicóptero
do exército venezuelano suscitou recentemente preocupação
entre os Yanomami do Brasil. A aeronave foi avistada em 8 de agosto,
na região do Xitei, extremo oeste da Terra Indígena
Yanomami (TIY) em Roraima, próxima à do Surucucu,
onde o exército brasileiro tem tropas aquarteladas. Além
dos Yanomami residentes no Xitei, estavam presentes representantes
de outras regiões da TIY, da Hutukara Associação
Yanomami (HAY) e de outras instituições, como Diocese
de Roraima, Ministério Público Federal e Distrito
Sanitário Especial Yanomami e Ye´kuana. A HAY elaborou
e enviou um documento às autoridades competentes denunciando
a invasão. Veja abaixo a íntegra da carta, em português
e em yanomami.
A recente invasão não é acontecimento isolado.
Em 2003 foram denunciadas várias entradas não-autorizadas
de militares venezuelanos na TIY. Em determinado momento, soldados
venezuelanos chegaram a pernoitar na comunidade yanomami do Poimopë,
no alto rio Mucajaí, onde intimidaram uma funcionária
da organização Urihi Saúde Yanomami (ex-conveniada
da Funasa) que atuava então no atendimento de saúde
na região. No mesmo período, outro grupo ocupou
uma pista de pouso de garimpo clandestino no alto rio Catrimani,
igualmente em território brasileiro, onde torturou garimpeiros
e saqueou seus pertences. Uma expedição de investigação
organizada pelo Exército Brasileiro e assessorada pela
CCPY confirmou posteriormente as preocupações dos
Yanomami quanto à freqüência das incursões
intempestivas dos militares venezuelanos em território
brasileiro. (ver
Boletim 41).
Carta
em português *
Sim, é dirigido a vocês, grandes homens, que nós
Yanomami, membros da Hutukara Associação
Yanomami, fizemos este documento. No dia 08/08/2007 durante
nossa reunião na região do Xitei vimos um helicóptero
do exército venezuelano (sobrevoando), havia também
não-indígenas (vendo isso conosco). Ao pousarmos
na pista do Xitei, na floresta brasileira, lá estava o
helicóptero da Venezuela vindo em nossa direção,
todos nós o vimos. Havia representantes da Diocese, Ministério
Público Federal, o chefe do Distrito Sanitário Especial
Yanomami e Ye´kuana, o membro da Hutukara Associação
Yanomami. Foi assim que nós vimos o helicóptero
da Venezuela. Nós Yanomami ficamos muito preocupados, por
isso fizemos este documento. Na região do Surucucu se encontra
o Exército Brasileiro mas ele não falou ainda, o
que é não é bom. Em Auaris há também
o Exército Brasileiro mas ele não ficou realmente
com os olhos atentos a isso. Os venezuelanos tal vez estão
procurando por ouro no Brasil, é o que nós Yanomami
pensamos. O pessoal (Yanomami) de Xitei vive na terra do Brasil.
Como o Exército Brasileiro realmente pensa sobre este assunto?
Quando os habitantes da Venezuela entram no Brasil vocês
do Exército Brasileiro não falam nada? Vocês
estão presente na terra-floresta yanomami, mas por que
não mostram sua valentia? Por esses motivos, nós
Yanomami estamos muito preocupados, pelo fato do Exército
não falar nada.
Assim foram nossas palavras.
Atenciosamente.
Dário Vitório Kopenawa Yanomami,
Tesoureiro da Hutukara Associação Yanomami- HAY
Carta em yanomami
Awei, pata wama ki hamë kami yanomae Hutukara Associação
Yanomami- HAY thëri yama kini hwei documento yama a thaprarema.
Dia 08/08/07 thë kuo tëhë Xitei hamë yama
ki hereãmuu huu tëhë helicóptero exército
do Venezuelano yama taama, ihi tëhë napëpë
pree kuoma. Pista Xitei ha yama ki ithorayu tëhë Brasil
urihi hamë helicóptero da Venezuela a kuaimama, tëhë
komi yama kini yama a taama. Representantes da Diocese a kuoma,
Chefe de Distrito Sanitário Especial Yanomami e Ye´kuana
a kuoma, Ministério Público Federal a kuoma, Hutukara
Associação Yanomami a kuoma. Inaha kure yama kini
helicóptero da Venezuela yama a taama. Kami yanomae yama
ki pata xuhurumoma yaro hwei documento yama thaprarema. Exército
Brasileiro Surucucu hamë pë kuama kure thë ã
hwaimi yaro thë yai pata hoximi mahi, Auaris hamë ai
exército Brasileiro pë pree kuama kure thëpë
mamo yai xatioimi mahi. Brasil a urihi hamë Venezuela pëni
ouro a thai hãthoaheta kami yanomae yama ki pihi kuu. Brasil
urihi hamë Xitei thëri pë piria yaro thë yai
pata mahi xuhurumuu. Witi naha exército Brasileiro wama
ki pihi yai kuu tha? Brasil thë urihi hamë Venezuela
thëripë huu tëhë exército Brasileiro
wama kiã yai hwaimi mahi, witi pii thëha exército
Brasileiro yanomae yama ki urihi pëhamë ai exército
pë kua makure thë ã waithiri hwaimi tha? Kuë
yaro kami yanomae yama ki yai xuhurumuu mahi, exército
peã hwaimi mahi yaro.
Inaha thë ã kutaoma.
Dário Vitório Kopenawa Yanomami,
Tesoureiro da Hutukara Associação Yanomami- HAY
* Tradução: Bruce Albert e Luis Fernando Pereira
»topo
Nova etapa de formação de professores yanomami
tem início
»topo
Teve início em 15 de agosto o VIII Curso de Formação
dos Professores Yanomami, na Terra Indígena Canauanim
(RR), com a participação de 35 professores,
representantes oito regiões da Terra Indígena
Yanomami: Auaris, Toototobi, Demini, Homoxi, Balawau, Papiu,
Kayanau e Catrimani I. O curso faz parte do Projeto Yarapiari
de Formação de Professores iniciado pela CCPY
em 2001 (Ver Boletins 19,
38,
53,
64,
66,
71,
74,
86
e 87)
e foi estruturado com as disciplinas de Organização
do Ensino, Pedagogia, Geografia, Antropologia, Direito,
História e Matemática.
A
opção por realizar o curso em terra indígena
wapishana partiu do convite do diretor da escola local,
Rivanildo Cadete Fidelis, e da possibilidade de ampliação
de momentos e espaços para o intercâmbio de
experiências e aprendizado mútuo. A Escola
de Ensino Médio do Canauanim também certificará
os professores yanomami participantes do curso.
Paralelamente,
e complementando os conteúdos das disciplinas, serão
realizadas oficinas com várias temáticas,
ministradas por representantes de diversas instituições.
Objetivo dessas oficinas é fomentar a discussão
sobre a legalização das escolas, a organização
do ensino através dos Projetos Políticos Pedagógicos
(PPPs), elaborados pelos próprios Yanomami, a certificação
dos professores Yanomami e a continuidade de sua formação,
preocupações apresentadas recentemente ao
Secretário de Estado de Educação de
Roraima, Luciano Moreira (Ver
Boletim 87).
São
parceiros da CCPY na realização desta edição
do curso a Rain Forest Foundation da Noruega (RFN), o Ministério
das Relações Exteriores da França (MAE),
a Organização dos Professores Indígenas
de Roraima (OPIR), a Secretaria de Educação
e Desporto de Roraima (SECD/RR) e a Fundação
Nacional do Índio (Funai). »topo
Yanomami da Venezuela
enviam carta sobre formação em saúde aos
Yanomami do Brasil
»topo
Yanomami da Venezuela que participam do segundo módulo
de formação de Agentes Comunitários Yanomami
de Atenção Primária em Saúde (ACYAPS)
promovido pelo Plan de Salud Yanomami (Ministerio de Salud) sob
a coordenação da Dra. Magda Magris e iniciado no
mês de abril, enviaram carta aos Yanomami do Brasil (Veja
abaixo) na qual enfatizam a importância deste tipo de
curso e conclamam que desenvolvem a mesma atividade. Diferentemente
do que ocorre no Brasil, onde a formação dos Agentes
Indígenas de Saúde (AIS) yanomami foi interrompida
há mais de dois anos pela Fundação Universidade
de Brasilia (conveniada da Funasa), o programa venezuelano de
formação de AIS contempla atividades de atendimento
realizadas diretamente pelos Yanomami além da coleta de
lâminas para diagnóstico de casos de malária.
O curso teve início com a revisão de conteúdos
trabalhados durante o primeiro módulo, como cálculo
de sinais vitais e peso, formas de administração
de medicamentos e exames físicos, entre outros. Após
esse primeiro momento, foram ministradas aulas com os seguintes
temas: atenção à criança de 0 a 30
dias, criança em risco, fatores de risco, atenção
às crianças entr um mês a 5 anos, infecções
respiratórias agudas, malária, oncorcecose, parasitoses
intestinais, afecções cutâneas, realização
de censos e registros de informação e estatísticas
de saúde. Cada um desses temas será trabalhado em
micromódulos com duração de três semanas
cada. O segundo módulo de formação de ACYAPS
segue até a segunda semana do mês de dezembro.
Carta em português *
Vocês, outros Yanomami (do Brasil), agirão da mesma
forma que nós, que estamos fazendo o curso de saúde,
vocês também o farão. Nós estamos fazendo
o curso sobre este assunto (saúde). Nós nos tornaremos
“agentes comunitários de atenção primária
de saúde”. Nós iremos onde moram os outros
Yanomami em regiões além das nossas e explicaremos
essas palavras. Nós aprendemos sobre isso no curso, nós
explicaremos sobre saúde, nós explicaremos sobre
aqueles que morrem. Ao vermos essas situações, nós
Yanomami ainda lembraremos em nossas casas coletivas quando trabalharmos
com saúde. Neste momento, nossos grandes homens estão
felizes por nós, eles nos retêm em seus pensamentos
em suas comunidades. Nós (que fazemos o curso) explicaremos
na nossa própria língua nas casas coletivas, primeiramente
às crianças, também aos velhos.
Quando não explicamos sobre as razões das antigas
mortes, ficamos pensando sobre suas causas. Entretanto, agora
que sabemos, nosso pensamento se alargou, foi por isso que os
velhos nos mandaram para o curso.
Não conhecíamos sobre como as epidemias chegavam
por isso nos mandaram, agora no curso nós aprendemos, por
isso estamos felizes. Também estamos felizes com aqueles
que nos ensinaram. Nos locais onde ficam nossas casas coletivas
os doutores realmente não aparecem, por isso os xamãs
e nós trabalhamos muito. No começo, nós pensamos:
“se não houvesse brancos, minha sogra curaria, mas
agora nós Yanomami conhecemos sobre as epidemias”.
Nós não sabemos como vocês (Yanomami do Brasil)
em suas casas estão refletindo sobre isso, portanto nós
lhes pedimos, façam um livro sobre medicina, nós
também o faremos.
Carta em yanomami
Thë ã yai rë kui ai Yanomami wamakini wama thë
tai mi hetuopë kamiyë yamakini hei Salud thë hami
curso yama thë rë thare thë kãi tapëhe.
Ihi thë noaha kama pë pehi curso thëha yamaki kua.
Agente Comunitaria en atencion primaria de Salud yamaki kupropë
ihi the ã rë kui kamiyë Yanomami yamaki rë
përiprawë rë piyëkëi hami yama thë
ã kãi weyëpë, komi thë pë pehi
thë mare kui. Ihi hei thë curso ha yama thë taarema
yaro Salud thë rë kui yama thë kãi tapë
thë pë rë nomaiwei yama thë kãi tapë
yama thë ha taarini kamiyë Yanomami yama kini shaponopi
nohi yai thaopë, Salud thë ha yamaki ohotamou tëhë.
Hei tëhë kamiyë yamaki patapi rë kui pë
puhi toprarou kamiyë yamaki iha wamareki no kãi tapouhe
kama pë shaponopiha.
Kamiyë yamakini kama pë shaponopi hami Yanomami thë
ã yaini yama pë kãi yai taa mapë, hapa
ihiru, pata pësho thë pë rë nomanowei yama
thë tai mao tëhë puhi weti nahamoma. Makui hei
tëhë yama thë tai ha yamaki nohi pëyëopë,
ihi pehi kama pata pëni wamareki shimamahe curso thë
hami, shawara pë rë huu kuaaiwei yama thë tanomi
wamareki ha shimiriheni yama thë taai, ihi thë curso
ha hei tëhë yamaki puhi toprarou. Wamareki kãi
rë hiraiwehei pë iha kãî, kamiyê
yamaki shaponopi rë kuprai hami totoro pë waroo toproimi
tikowë ha, kama pata pë rë shaporimouwei pësho
yamaki pruka ohotamopë. Kamiyë yamakini yama thë
rë taarenowei yama kisho. Hapa yamaki pu hi kuma: kamiyë
napë ya kuo ma kunoha ipa yapë no hërimapiwei,
ihi makui Yanomami yamaki makui yama thë taarema. Ihi thë
noaha yamaki nohi rîa thapoyou shawara aha. Kahë wamaki
shaponopi hami wamaki puhi rë taeo kuaaiweinaha yama thë
taimi ha kahë pëmaki nakapou medicina pëha wamaki
kãi ripromopë, wama thë kãî taai
mi hetuopë kamiyë yamakini yama thë taai rë
kurenaha.
*
Tradução: Luis Fernando Pereira »topo