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Interrompido o atendimento em saúde na Terra Indígena Yanomami

Yanomami denunciam aumento contínuo de casos de malária nas regiões do Parawau e Toototopi (AM)
Mortes em função da falta de atendimento nos rios Marauiá, Padauiri, Demini e Aracá (AM)
Impunidade favorece presença garimpeira na Terra Indígena Yanomami
Professores yanomami pesquisam organizações indígenas de Roraima

Interrompido o atendimento em saúde na Terra Indígena Yanomami

Os funcionários da Fundação Universidade de Brasília (FUB), instituição conveniada à Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para o atendimento em saúde na Terra Indígena Yanomami decretaram greve geral por tempo indeterminado, interrompendo o seu trabalho na área indígena. O motivo da greve é um novo atraso de mais de dois meses no pagamento de seus salários, no valor de R$ 2 milhões. Setenta funcionários já saíram recentemente de área a fim de protestar com o descaso da Funasa.

Os agentes de saúde remanescentes se retiram nos próximos dias dos 22 pólos do território yanomami, deixando finalmente sem nenhuma espécie de atendimento cerca de 9 mil Yanomami nos estados de Roraima e Amazonas. As possíveis conseqüências de uma paralisação dessa magnitude são extremamente preocupantes e já prefiguradas, em escala menor, em várias áreas da Terra Indígena Yanomami no Amazonas, cujas comunidades já foram abandonadas à própria sorte pela desagregação da estrutura de atendimento desde o mês passado (Ver matérias abaixo).

A possibilidade de greve geral não era novidade (Ver Yanomami na Imprensa – 27/04/2006 - Pagamento de Profissionais Está Atrasado Mais Uma Vez). No dia 13 de maio cerca de 70 funcionários da FUB já abandonaram seu trabalho nas comunidades yanomami, que permaneceram assistidas precariamente por apenas dois ou três atendentes por pólo-base. Na ocasião, os trabalhadores estabeleceram o dia 18 de maio como prazo final para o repasse dos salários atrasados aos mais de 200 funcionários do convênio Funasa-FUB, o que não ocorreu apesar de um depósito de R$ 975 mil na conta da FUB, referente à folha de pagamento de apenas um mês, realizado no dia 9 de maio (Ver Yanomami na Imprensa – 13/05/2006 - CRISE NA FUB - Metade dos funcionários abandona área indígena).

Apesar das declarações do coordenador regional da Funasa - RR, Ramiro Teixeira, assegurando esforços em “encontrar outras maneiras de manter a assistência indígena” (Ver Yanomami na Imprensa – 9/05/2006 - Funcionários da Funasa reduzem atendimentos em áreas indígenas) e o anúncio da contratação em caráter de urgência de 150 profissionais de saúde, os Yanomami manifestaram sua desconfiança na possibilidade de que sejam realmente implementada soluções de atendimento concretas e eficientes, em vista da incapacidade crônica do convênio Funasa-FUB em atender suas necessidades sanitárias desde fim de 2004 (Ver Boletins 60, 67, 68, 70, 71, 72, 73, 75 e 77). A situação chegou a tal ponto que três funcionários da FUB foram impedidos pelos Yanomami de deixar a Terra Indígena, devido aos temores, agora concretizados, de paralisação total de atendimento. Os funcionários foram liberados em 17 de maio, apenas um dia antes da decisão pela greve geral tomada pelo Sindicato dos Profissionais de saúde. > subir


Yanomami denunciam aumento contínuo de casos de malária nas regiões do Parawau e Toototopi (AM)

ALideranças, professores e microscopistas yanomami alertam para o crescimento contínuo dos casos de malária nos pólos Parawau e Toototobi, no alto rio Demini (AM), cujo atendimento de saúde é de responsabilidade do convênio Funasa-FUB. Em carta redigida no dia 25 de abril os Yanomami do pólo do Parawau apontam como fator determinante para o recrudescimento da malária a ineficácia do trabalho de guardas de endemia, responsáveis por borrifações de veneno nas casas comunitárias e localização de focos transmissores: “Na região do Parawau aqueles que matam os mosquitos carapanãs (agentes de endemia) não trabalham muito por isso a malária tornou a crescer fortemente” (Ver carta na íntegra abaixo).

Do Toototobi informações mais precisas foram enviadas pelos próprios microscopistas yanomami, assustados com possibilidades de agravamento do quadro devido à greve geral dos funcionários da saúde. Até o dia 24 de maio, foram registrados mas 41 casos de malária, assim distribuídos: onze casos na comunidade do Xiroxiropiu; oito casos na comunidade do Rasasi; cinco casos na comunidade de Apiahiki; quatro casos em Kaxitao; cinco casos em Okarasipë; quatro casos no Piau; e mais quatro casos em Koyopi.

A região do alto rio Demini, onde se situam além de ambos os pólos a comunidade do Demini, é uma das mais atingidas pela malária, proveniente de várias frentes, como as zonas de garimpo na Venezuela, próximas à fronteira, e a ocupação de áreas limítrofes da Terra Indígena por moradores de municípios próximos (Ver Boletins 71, 72 e 73). Em 2005, o atendimento de saúde nos três pólos da região registrou 338 casos, sendo 296 de Vivax e 42 de Falciparum, forma letal da doença (Ver Boletim CCPY 75).

Parawa-ú, 25 de abril de 2006.

Palavras sobre o crescimento da malária no Parawau
A malária voltou a surgir na nossa terra-floresta.

No Maxapipi, Etewexipi [nomes de comunidades do sub-pólo] e também entre aqueles que vivem próximos ao posto o mal da malária cresceu muito rapidamente.

Na região do Parawau aqueles que matam os mosquitos carapanãs [agentes de endemia] não trabalham muito por isso a malária tornou a crescer fortemente. Nós Yanomami queremos pedir às lideranças da Funasa ações para acabar com os carapanãs, corretamente e em larga escala.

Vocês [da Funasa] não devem usar a toa este dinheiro destinado a nós, Yanomami, ao enviarem esses brancos que não trabalham.

Nós Yanomami queríamos ficar felizes ao escolhermos por vocês da Funasa. Quando vocês da Funasa enviarem funcionários, vocês devem falar direito para eles, assim eles trabalharão bem na nossa floresta. Esses que trabalham na nossa floresta yanomami devem ser questionados por vocês.
Acabaram-se nossas palavras.

Assinam:

Geraldo Yanomami conselheiro
Carlita Yanomami
Rafael Wanari Yanomami Professor
Platão Ixarori Yanomami Professor
Ivan Yoroana Yanomami Professor

Carta em Yanomami:
Parawauha malária a tirerayou wei të ã oni.
Kamiyë yamaki urihi pihami malaria kua kõprarioma.
Maxapapi hami xo, etewexipi hami xo, postoha pë përio aheteowei pëxo, ihi pë yaiha malária a wayuyai ropeyai tirerayoma.
Região Parawa u hami ukuxi nomamare wë pë kuama kure pë kiyaaimi mahi yaro malária kohipi kua kõprarioma. Kamiyë yanomami yama kini Funasa patamorewë iha ukuxipë xaari nomamai piyëkouwei ihi yama a nakai puhio.
Napë pë kiyaai maoweiha ihi wama pëha ximani kami yë yanomai wamare ki dinheiro pë hai kiai pëonomai.
Kamiyë yanomami yama kini Funasa teri wama ki yaai tëhë yama ki xi topra rou puhio. Funasa wama kini funcionarios wa ma pë ximai tëhë kama pëha wamakia xaarihai kamiyë yanomami yama ki urihi pihami pë xaari kiyaa pë. Kamiyë yanomami yama ki urihi pihami pë kuowei wama pë xaari wari.
Awei të ã maprarioma
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Mortes em função da falta de atendimento nos rios Marauiá, Padauiri, Demini e Aracá (AM)

Três Yanomami morreram recentemente devido à falta de assistência de saúde entre as populações dos rios Marauiá, Padauiri, Demini e Aracá, nos municípios de Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos/AM, normalmente atendidas pelo Serviço de Cooperação com o Povo Yanomami (Secoya), organização não-governamental conveniada da Funasa. O programa de saúde da entidade esta suspenso desde o dia 20 de abril, após quatro meses sem que a Funasa repasse as devidas verbas previstas para a ONG, impossibilitando o pagamento de salários e a aquisição de medicamentos e materiais.

Os três óbitos foram registrados entre os cerca de 2.400 habitantes dessas regiões: uma criança com um ano de idade, por malária; um idoso por picada de cobra; e outro que pode ter sido, segundo os Yanomami, por pneumonia e/ou por malária. Diante dos fatos Silvio Cavuscens, coordenador geral do Secoya, declarou: “Agora deve ficar clara a importância da manutenção de uma assistência permanente e contínua, com acompanhamento via rádiofonia. A partir do momento que não há mais condições mínimas, como ocorreu, a coisa se degenera rapidamente”.

Segundo Cavuscens, o discurso da Funasa sobre irregularidades nas prestações de contas feitas pelas conveniadas, usado para justificar os atrasos nos pagamentos, não corresponde à realidade: “Quando terminou a vigência anterior do convênio, eles [Funasa] falaram: ‘vão continuando com as atividades que depois a gente resolve’. O ano passado nós [Secoya] ficamos quase cinco meses sem recursos, nosso pessoal agüentando em área, nós ficamos agüentando para não deixarmos a qualidade cair. Só que a nossa relação com os fornecedores estava melhor, não tínhamos tantas dívidas na praça e deu para agüentar. Agora não deu”.

Quando ficou claro que não haveria meios de continuar com as atividades de saúde em área, o Secoya divulgou nota pública expondo os motivos que o levaram à interrupção do atendimento, evidenciando a total falta de estrutura e materiais básicos, como os destinados aos tratamentos de malária, acidentes ofídicos e doenças respiratórias que vitimaram em menos de um mês três Yanomami: “A falta de medicamentos nos postos de saúde dificulta o trabalho dos profissionais na continuidade dos tratamentos, ocasionando um aumento nos casos de IRA (Infecção Respiratória Aguda) e DDA (Doença Diarréico Agudo), consequentemente aumentando as chances de óbito na população infantil, que se encontra em número elevado nos dados de saúde.

A falta do Soro Antiofídico está causando pânico entre os profissionais, que em situações de necessidades tornam-se incapazes de realizar os procedimentos para o tratamento imediato, tendo como alternativa apenas a remoção do paciente para os municípios de referência, ocasionando assim um aumento de gastos de combustível. A malária vem se tornando um pesadelo para os Pólos Bases, que nas ultimas semanas não dispõe de medicamentos (Primaquina de 5 e 15mg, Cloroquina 150mg, Mefloquina 250mg), para a continuidade das ações de saúde, e atender os casos de malária diagnosticados nas buscas ativas e passivas” (Ver comunicado na íntegra).

Após exaustivas reuniões com representantes da Funasa em Brasília, o Secoya obteve garantias de que o valor de 347 mil reais seria liberado até o dia 19 de maio. “A partir de então, nossa meta é agir o mais rapidamente possível e enviarmos equipes a campo a partir da próxima sexta-feira (dia 26 de maio). Imediatamente não teríamos como, já que ainda não temos dinheiro para pagar os fornecedores e conseguir alimentos, comprar remédios e combustível”, afirmou Cavuscens. > subir


Impunidade favorece presença garimpeira na Terra Indígena Yanomami

OParalelamente ao esvaziamento dos postos de saúde, ocasionado pela desestruturação na qualidade dos serviços de atendimento, agravam-se os sinais de presença ilegal de garimpeiros em Terra Indígena Yanomami. Chega a 14 o número de garimpeiros retirados da área pela Polícia Federal em menos de um mês Denunciados pela Fundação Nacional do Índio (Funai), foram localizados e removidos da terra indígena em ação conjunta com a Polícia Federal. No dia 22 de abril quatro deles foram localizados próximos ao Arathau, pólo-base próximo ao do Surucucu, onde funciona um batalhão do exército brasileiro. Seis dias depois, outros três foram encontrados e levados a Boa Vista (RR), onde foram liberados após depoimentos.

Durante o início do mês de maio, mais sete foram retirados da região do Catrimani, município de Alto Alegre (RR), sendo que dois deles apresentavam ferimentos causados por balas. De acordo com declarações do coordenador substituto da Funai, José Raimundo Batista, pelo menos este último grupo já se encontrava há bastante tempo atuando na terra indígena e se dirigiu aos postos em busca de cuidados médicos.

Tais fatos corroboram as constantes denúncias feitas pelos Yanomami que alertam há tempos sobre o crescimento e intensificação das atividades ilegais de garimpo em terra indígena (Ver Boletins 34, 43, 45, 47, 63, 65, 72 e 73). Segundo José Raimundo Batista, a situação é fruto direto de um sentimento de impunidade que vigora entre os garimpeiros: “Eu avalio esta situação devido a um sentimento de impunidade por parte da Justiça. A gente efetua a retirada, traz eles, entrega na Justiça. Aí a Justiça não pega eles, eles não têm um produto que caracteriza a garimpagem dentro da terra indígena, como alegado na Justiça, aí eles simplesmente prestam depoimento na Polícia Federal e são liberados novamente. E posteriormente, diante da impunidade, eles retornam a praticar a garimpagem ilegal”.

Apesar de não contar com números exatos no momento, a Funai estima entre 700 e 800 o número de garimpeiros em terras indígenas no estado de Roraima, sendo que grande parte se encontra no território yanomami, principalmente nos sub-pólos de Arathau, Catrimani, Xitei e Parafuri. Essas regiões são algumas das mais invadidas por garimpeiros na Terra Indígena Yanomami. Em Arathau funcionários da Fundação Universidade de Brasília (FUB) chegaram a ser ameaçados, impossibilitando o trabalho de saúde e causando o fechamento temporário do posto de atendimento (Ver Boletins 72 e 73).

Quando não ocorre atrasos no repasse de recursos do Governo Federal para operações de retirada de garimpeiros estas se vêm prejudicadas por estratégias inadaptadas. Assim, no final de 2005, a Polícia Federal sobrevoou a Terra Indígena limitando-se a lançar panfletos na floresta para informar os garimpeiros da ilegalidade da sua presença na terra indígena. O maior resultado obtido foi que os infratores, prevenidos, se esconderam melhor na floresta e ficaram mais cautelosos, dificultando ainda mais ações efetivas futuras de desintrusão por parte dos órgãos federais (Ver Yanomami na Imprensa – 19/12/2005 - Aumenta presença de garimpeiros na terra indígena Yanomami, alerta coordenador de ONG). > subir


Professores yanomami pesquisam organizações indígenas de Roraima

Professores yanomami acompanham a atuação e o cotidiano de organizações indígenas de outros grupos em Roraima na nova edição do programa de intercâmbio promovido pela CCPY (Ver Boletins 29, 42 e 69). Face aos novos desafios que representam a criação da Hutukara Associação Yanomami em 2004 (Ver Boletins CCPY 55, 66, 70 e 73), professores e lideranças decidiram enfocar como tema do intercâmbio, em seu sexto ano de funcionamento, as modalidades de organização política dos Wapixana representados, entre outros, pelo Conselho Indígena de Roraima (CIR), pela Organização dos Professores Indígenas de Roraima (OPIR), e pela Associação dos Povos Indígenas do Estado de Roraima (Apirr). Desde o dia 29 de março seis professores yanomami se dividem entre atividades de imersão e pesquisa em seis comunidades distribuídas entre as terras indígenas Serra da Moça, Truaru, Barata/Livramento e Anta.

Tratam-se de comunidades relativamente próximas à Boa Vista, capital de Roraima, proporcionando situações de diálogo relativamente novas aos Yanomami que, por exemplo, observam a intensa presença de políticos nas comunidades durante ano eleitoral. Segundo Maurice Tomioka, assessor do programa de educação da CCPY, tal situação acabou se demonstrando altamente pedagógica para os participantes ao intercâmbio: “Por ter gerado as dúvidas e questões que suscitou entre os Yanomami, foi ótimo. Surgiram novas e interessantes indagações sobre a política institucional dos brancos”.

Além dos novos temas, antigas questões , como a necessidade de domínio da língua portuguesa, enquanto ferramenta de diálogo interétnico e de fortalecimento de laços entre os diversos grupos indígenas de Roraima, foram trabalhadas em novos contextos. Edimilson Silva de Albuquerque, vice-coordenador da Apirr, desempenhou papel importante ao comentar com os professores visitantes como os estereótipos sobre os Yanomami foram eficazmente desconstruídos pelos seus esforços em apropriar-se de novas situação de aprendizagem como os intercâmbios indígenas e os cursos de informática promovidos em Boa Vista pela CCPY (Ver Boletins CCPY 27, 36 e 49).

Os professores yanomami iniciam no final do mês de maio seu retorno a Boa Vista, onde ainda permanecerão um tempo para completar os seus trabalhos de pesquisas com entrevistas com os diretores das associações e organizações indígenas e finalizar uma publicação para circulação nas escolas yanomami.


Boletim Pró-Yanomami Nº 78 - Fechamento: 26/05/2006
Coordenação Editorial: Alcida Rita Ramos, Bruce Albert, Jô Cardoso de Oliveira
Redação: Luis Fernando Pereira


 

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